STJ. QO no AgRg na APn 973-RJ

Enunciado: No caso, os fatos imputados foram supostamente cometidos durante o exercício do cargo de vice-governador, relacionados às funções desempenhadas; não houve início da instrução criminal, razão pela qual a competência deveria ser afetada em razão de o agente ter vindo a ocupar outro cargo, qual seja, o de governador, submetido à competência constitucionalmente fixada no Superior Tribunal de Justiça. O feito encontra-se em fase inquisitorial, sendo que, em relação ao atual governador do Estado, há somente uma medida de busca e apreensão deferida, não havendo denúncia oferecida tampouco desdobramento algum desse fato. Com efeito, o julgamento da AP 937 QO no Supremo Tribunal Federal cuidou da hipótese exclusiva de parlamentares federais e em situação específica. Efetivamente, a hipótese na qual a definição da competência diz respeito a fatos supostamente cometidos por vice-governador à época, atualmente governador do Estado, não foi solucionada pelo apontado paradigma que, por via de consequência, não se presta como padrão decisório. Os fatos estão intrinsecamente relacionados ao exercício das funções, não necessariamente de vice-governador, mas como integrante da cúpula do Poder Público estadual. O vice-governador, supostamente, praticou os atos no exercício de suas funções, com inobservância dos deveres funcionais, em troca de supostas vantagens indevidas, caracterizada a relação de causalidade entre o crime imputado e o exercício do cargo. O fato de ter assumido a condição de governador, no mesmo mandato, revela identidade de investidura funcional para os escopos preconizados pela regra do foro por prerrogativa de função, outorgada ratione muneris, não sendo configurada espécie alguma de privilégio em favor do cidadão, mas obséquio às funções exercidas. Dessa forma, cabe ao Superior Tribunal de Justiça a análise do bem jurídico tutelado e a definição da competência na hipótese de declínio, sob pena de ofensa à estrutura hierarquizada da Jurisdição e à própria racionalidade do Sistema de Justiça. Ainda, os fatos configuram, em tese, e, segundo alegado, crimes comuns, não havendo falar-se abstratamente em interesse da União.

Tese Firmada: Compete ao Superior Tribunal de Justiça, para os fins preconizados pela regra do foro por prerrogativa de função, processar e julgar governador em exercício que deixou o cargo de vice-governador durante o mesmo mandato, quando os fatos imputados digam respeito ao exercício das funções no âmbito do Poder Executivo estadual.

Questão Jurídica: Prerrogativa de foro. Condutas supostamente praticadas na condição de vice-governador. Agente atualmente governador. Crime comum. Competência do STJ.

Ementa: QUESTÃO DE ORDEM NO AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO PENAL. PROCESSUAL PENAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA. PRERROGATIVA DE FORO. CONDUTAS SUPOSTAMENTE PRATICADAS NA CONDIÇÃO DE VICE-GOVERNADOR. AGENTE QUE É ATUAL GOVERNADOR DE ESTADO. CRIME COMUM. COMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1. Compete ao Superior Tribunal de Justiça, para os fins preconizados pela regra do foro por prerrogativa de função, processar e julgar Governador em exercício que deixou o cargo de Vice-Governador durante o mesmo mandato, quando os fatos imputados digam respeito ao exercício das funções no âmbito do Poder Executivo estadual. 2. Na espécie, cuida-se de investigação originária no âmbito do Ministério Público do Rio de Janeiro a envolver empresários e autoridades integrantes dos Poderes Executivo e Legislativo daquele Estado, com base em suposta aquisição superfaturada de equipamentos para o combate à pandemia de Covid-19 e organização criminosa que teria operado desvio, em proveito de deputados, de sobras dos duodécimos do Poder Legislativo "doados" ao erário estadual a pretexto de financiar as Secretarias Municipais de Saúde. 3. Nesse contexto, sopesadas as circunstâncias do caso concreto, infere-se que: a) o controle da legalidade das investigações que englobem Governador de Estado deve ficar a cargo do STJ; b) antes do início da instrução criminal, o foro por prerrogativa de função é afetado em função da mudança de cargo; c) os fatos imputados referem-se a uma suposta organização criminosa a abranger a cúpula dos órgãos governamentais do Estado, tendo o ora agravante atuado no exercício de funções administrativas da chefia do Executivo estadual; d) o agravante era do mesmo grupo político e de governo, em tese, envolvido nos fatos e veio a assumir o cargo de Governador em razão do afastamento do então titular durante o mesmo mandato, não havendo hiato no desempenho das funções objeto das investigações. 4. Questão de ordem acolhida a fim de reconhecer a competência do STJ para processar e julgar o feito em relação ao atual Governador do Estado do Rio de Janeiro. (STJ. QO no AgRg na APn 973-RJ, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Rel. para acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, por maioria, julgado em 3/5/2023 - Publicado no Informativo nº 775)