STJ. CC 192.658-RO

Enunciado: Trata-se de conflito negativo de competência em inquérito policial instaurado para apurar a suposta prática dos crimes de posse irregular de arma de fogo e pesca ilegal, por indivíduo que se autodeclarou quilombola. A Justiça estadual declinou de sua competência com o entendimento de que a autodeclaração do indiciado de que seria quilombola atrairia a competência da Justiça Federal. Em casos assemelhados, referentes a povos indígenas, o Supremo Tribunal Federal e esta Corte já esclareceram que a competência será da Justiça Federal nos feitos que versem acerca de questões ligadas à cultura ou disputas de interesses das comunidades indígenas. Por isso, esta Corte, inclusive, editou a Súmula 140, clara ao estabelecer que "compete à justiça comum estadual processar e julgar crime em que o indígena figure como autor ou vítima" (Terceira Seção, DJe 24/5/1995). No caso, porém, não se verifica, da atuação do indiciado, disputa alguma por terra quilombola ou interesse da comunidade na ação delituosa. O fato de o investigado se autodeclarar quilombola, por si só, não atrai a competência da Justiça Federal, isso porque não há nos autos elementos que evidenciem que os crimes ambientais perpetrados foram em detrimento do interesse direto e específico da União, de suas entidades autárquicas ou de empresas públicas federais. Assim, se não se verifica lesão a bens, serviços ou interesses da União ou de seus entes, afasta-se a competência da Justiça Federal. Nesse sentido, "o mero fato de índio figurar como autor do delito ambiental, sem nenhuma conotação especial, não enseja o deslocamento da causa para a Justiça Federal, conforme enunciado da Súmula n° 140/STJ" (CC 93.120/AM, rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 9/6/2010, DJe 17/6/2010).

Tese Firmada: Compete à Justiça estadual processar e julgar causa quando não se verifica, da atuação de indiciado que se autodeclara quilombola, disputa alguma por terra quilombola ou interesse da comunidade na ação delituosa.

Questão Jurídica: Conflito negativo de competência. Posse irregular de arma de fogo e pesca ilegal. Indiciado que se autodeclara quilombola. Ausência de disputa por terra ou interesse da comunidade na ação delituosa. Aplicação da Súmula n. 140 do STJ.

Ementa: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO E PESCA ILEGAL. INDICIADO QUE SE AUTODECLARA QUILOMBOLA. AUSÊNCIA DE DISPUTA POR TERRA OU INTERESSE DA COMUNIDADE NA AÇÃO DELITUOSA. APLICAÇÃO, MUTATIS MUTANDIS, DA SÚMULA N. 140 DESTA CORTE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM ESTADUAL. 1. O Supremo Tribunal Federal e esta Corte, em casos assemelhados, referentes a povos indígenas, já esclareceram que a competência será da Justiça Federal nos feitos que versem sobre questões ligadas à cultura ou disputas de interesses das comunidades indígenas. 2. No caso, foi instaurado inquérito policial para apurar a suposta prática dos crime de posse irregular de arma de fogo e pesca ilegal, por indivíduo que se autodeclarou quilombola, não se verificando, porém, qualquer disputa por terra quilombola ou interesse da comunidade na ação delituosa, o que evidencia a competência da Justiça Estadual para processar e julgar a presente causa. 3. Conflito conhecido, para declarar competente o Juízo de Direito da Vara Única de Alta Floresta do Oeste - RO, o Suscitado. (STJ. CC 192.658-RO, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 10/5/2023, DJe 16/5/2023 - Publicado no Informativo nº 777)