STJ. HC 682.181-RJ

Enunciado: Ainda que se possa conjecturar que o Juiz de Direito, no caso, tenha sido incisivo em seus questionamentos, não há como concluir que atuou na condução do feito de forma parcial, valendo, ainda, referir que a "'aferição da suspeição do magistrado é tema que envolve debate de nítido colorido fático-processual, inviável de ser efetivado no seio do mandamus' (HC 131.830/SP, Sexta Turma, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 1°/2/2013)" (HC 705.967/SC, Rel. Ministro Jesuíno Rissato - Desembargador convocado do TJDFT -, Quinta Turma, julgado em 13/12/2021, DJe 15/12/2021). A alegada suspeição do Juiz Togado, no caso, parece até ser desinfluente para a solução da controvérsia, porque o magistrado Presidente não tem competência constitucional para julgar os crimes dolosos contra a vida. Em outras palavras, não há como reconhecer prejuízo ao réu também porque o mérito da causa não foi analisado pelo Juiz de Direito, mas pelos Jurados. Dessa forma, incide na espécie a regra prevista no art. 563 do Código de Processo Penal - a positivação do dogma fundamental da disciplina das nulidades -, de que o reconhecimento de vício que enseja a anulação de ato processual exige a efetiva demonstração de prejuízo (pas de nullité sans grief). Ademais, a doutrina ressalta que o munus de julgar confere ao leigo responsabilidade, além de provocar-lhe o sentimento de civismo. É por isso que não se pode compreender que tão somente uma postura mais firme (ou até mesmo dura) do magistrado Presidente influencie os jurados - a quem a Constituição Federal pressupôs a plena capacidade de discernimento, ao conceber o direito fundamental do Tribunal do Júri (art. 5º, inciso XXXVIII). Nesse sentido, o STJ já decidiu que "A condução pelo togado do interrogatório da ré, durante o júri, de forma firme e até um tanto rude, não importa, necessariamente, em quebra da imparcialidade do magistrado e nem influência negativa nos jurados (...)" (HC 410.161/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 17/4/2018, DJe de 27/4/2018).

Tese Firmada: Não se pode compreender que uma postura mais firme (ou até mesmo dura) do Juiz Presidente ao inquirir testemunha, durante a sessão plenária, influencie os jurados, a quem a Constituição da República pressupôs a plena capacidade de discernimento, ao conceber o direito fundamental do Tribunal do Júri.

Questão Jurídica: Tribunal do Júri. Alegação de parcialidade do Juiz Presidente. Suspeição. Reexame de provas e argumento não influente para a controvérsia. Competência para julgar os crimes dolosos contra a vida que cabe ao Conselho de Sentença.

Ementa: HABEAS CORPUS. TRIBUNAL DO JÚRI. DIREITO PROCESSUAL PENAL. WRIT SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL, IMPETRADO QUANDO O PRAZO PARA A INTERPOSIÇÃO DA VIA RECURSAL CABÍVEL NA CAUSA PRINCIPAL AINDA NÃO HAVIA FLUÍDO. INADEQUAÇÃO DO PRESENTE REMÉDIO. PRECEDENTES. EVENTUAL SUPERVENIÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO QUE AGREGA ÓBICE À COGNIÇÃO DO PEDIDO. ART. 105, INCISO I, ALÍNEA E, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DESCABIMENTO DE CONCESSÃO DE ORDEM DE OFÍCIO. ALEGAÇÃO DE PARCIALIDADE DO JUIZ PRESIDENTE DO TRIBUNAL DO JÚRI. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. COMPETÊNCIA PARA JULGAR OS CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA ATRIBUÍDA CONSTITUCIONALMENTE AO CONSELHO DE SENTENÇA, E NÃO AO JUIZ DE DIREITO. EVENTUAL INFLUÊNCIA NEGATIVA DA CONDUÇÃO DE INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHA, PELO MAGISTRADO TOGADO, SOBRE OS JURADOS, NEM SEQUER ALEGADA NA INICIAL DO WRIT. PEDIDO DE HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. Hipótese na qual as indagações do Juiz Presidente do Tribunal do Júri ao inquirir a irmã da Vítima durante a sessão plenária guardam absoluta relação com a causa, formuladas para que se esclarecesse quem em regra iniciava as constantes agressões mútuas (se a Ofendida, que foi morta, ou seu companheiro, o Réu, ora Paciente). Ainda que se possa conjecturar que o Juiz de Direito tenha sido incisivo em seus questionamentos, não há como concluir que atuou na condução do feito de forma parcial. 2. A "suspeição, via de regra, é assunto impróprio ao veio restrito do habeas corpus, pois, além de ter o meio adequado (exceção), a análise de eventual motivo para afastar o magistrado de um processo demanda revolvimento de aspectos fáticos não condizentes com a via eleita" (STJ, HC 405.958/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 5/12/2017, DJe 12/12/2017). 3. A alegada suspeição do Juiz Togado parece até ser, in casu, desinfluente para a solução da controvérsia, porque o Magistrado Presidente não tem competência constitucional para julgar os crimes dolosos contra a vida. Em outras palavras, também não há como reconhecer o alegado vício porque o mérito da causa não foi analisado pelo Juiz de Direito, mas pelos Jurados. 4. Na espécie presume-se ainda que a Defesa nem sequer cogitou de eventual influência negativa do Magistrado Togado, sobre os jurados, ao inquirir testemunhas, pois essa conjuntura não foi alegada na inicial. Assim, incide a regra prevista no art. 563, do Código de Processo Penal - a positivação do dogma fundamental da disciplina das nulidades -, de que o reconhecimento de vício que enseja a anulação de ato processual exige a efetiva demonstração de prejuízo (pas de nullité sans grief). 5. E, ainda que assim não fosse, cabe referir que a doutrina ressalta que o munus de julgar confere ao leigo responsabilidade, além de provocar-lhe o sentimento de civismo ( v.g , NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri: 9.ª ed. Rio de Janeiro, Forense, 2022. p. 22). É por isso que não se pode compreender que tão somente uma postura mais firme (ou até mesmo dura) do Magistrado Presidente influencie negativamente os Jurados - a quem a Constituição da República pressupôs a plena capacidade de discernimento, ao conceber o direito fundamental do Tribunal do Jú ri (art. 5.º, inciso XXXVIII). 6. Sem a demonstração de configuração de quais quer das hipóteses legais que configurem a suspeição do juiz, referidas no art. 254 do Código de Processo Penal, não há nulidade a ser reconhecida. Por todos esses fundamentos, e em homenagem ao princípio da soberania dos veredictos do Tribunal do Júri (art. 5.º, inciso XXXVIII, alínea c, do Texto Constitucional), a hipótese não é de afastamento da conclusão do Conselho de Sentença, possível somente em circunstâncias excepcionais. 7. Pedido de habeas corpus não conhecido. (STJ. HC 682.181-RJ, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 16/5/2023, DJe 23/5/2023 - Publicado no Informativo nº 777)