STJ. AREsp 584.752-RS

Enunciado: Segundo disposto na redação original do artigo 233, da Lei n. 9.503/1997 (CTB) configurava infração grave, sancionada com multa e retenção do veículo, deixar de efetuar o registro de transferência de propriedade no prazo de 30 (trinta) dias junto ao órgão executivo de trânsito, conforme hipótese estabelecida no artigo 123, inciso I. Assim, a falta de registro da transferência do veículo pelo novo proprietário no órgão competente, em até 30 (trinta) dias, diga-se, infração de natureza administrativa associada à propriedade de bem móvel, era considerada infração de natureza grave à época dos fatos (artigo 233), e impossibilitava o proprietário, como condutor de veículo, adquirir a Carteira Nacional de Habilitação - CNH (artigo 148, § 3º), após o esgotamento do período de permissão para dirigir (148, § 2º), obrigando-o a reiniciar todo o processo de habilitação (artigo 148, § 4º). A literalidade do § 3º do artigo 148 da Lei n. 9.503/1997, portanto, acaba por impedir o proprietário de veículo que cometeu infração administrativa, associada especificamente ao registro de propriedade de veículo, adquirir a CNH, que é documento vinculado à habilitação para condução de veículos automotores e à segurança no trânsito, o que denota, em princípio, a ocorrência de tratamento desigual entre condutores-proprietários, já contemplados com a CNH, e condutores-proprietários que possuem somente a Permissão de Dirigir, com validade de um ano, mas que pretendem obter a CNH. É dizer, a omissão do proprietário de veículo em não efetuar o seu registro no órgão executivo de trânsito, ainda que sujeita à sanção de natureza grave à época, não está diretamente associada à conduta do condutor de veículo automotor. A Corte Especial, por sua vez, apreciou a arguição de inconstitucionalidade do § 3º do artigo 148 da Lei n. 9.503/1997 (CTB), no julgamento do AI no AREsp 641.185/RS, Relator Ministro Og Fernandes, na sessão de 11/2/2021, dando cumprimento à decisão contida no ARE 1.195.532/RS, proferida pelo Supremo Tribunal Federal. Na oportunidade, foi reconhecida, por unanimidade, a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, da norma contida no § 3º do artigo 148 "[...] para excluir sua aplicação à hipótese de infração (grave ou gravíssima) meramente administrativa, ou seja, não cometida na condução de veículo automotor". Ocorre que o acórdão da Corte Especial no qual declarada a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do § 3º do artigo 148 do CTB, foi impugnado por meio de recurso extraordinário e os autos ascenderam ao Supremo Tribunal Federal, retornando à relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, que deu provimento ao apelo extremo, sob a compreensão de que a norma contida no § 3º do artigo 148 do CTB é compatível com a Constituição Federal, não havendo ofensa aos princípios da isonomia, da razoabilidade e da proporcionalidade. Por fim, em sede de agravo interno, o entendimento do Relator foi mantido pela Primeira Turma da Corte Suprema. Diante desse novo contexto, diga-se, com a declaração de compatibilidade do § 3º do artigo 148 do CTB com a Constituição Federal feita pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, ainda que não se trate de controle de constitucionalidade de norma realizado pelo Plenário da Corte Constitucional, tem-se que o acórdão da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça foi cassado. Logo, faz-se necessário reconhecer que a norma é aplicável, o que equivale dizer que, no caso, é lícito ao Órgão de trânsito indeferir o pedido de Carteira Nacional de Habilitação - CNH ao condutor que, portador da Permissão para Dirigir, cometeu infração grave, independentemente dessa infração ser qualificada como de natureza administrativa ou na condução do veículo.

Tese Firmada: É lícito ao órgão de trânsito indeferir o pedido de Carteira Nacional de Habilitação - CNH ao condutor que, portador da Permissão para Dirigir, cometeu infração grave, independentemente dessa infração ser qualificada como de natureza administrativa ou na condução do veículo.

Questão Jurídica: Prática de infração de natureza grave pelo proprietário do veículo. Falta de registro no prazo estabelecido na redação original do art. 233 do CTB. Pedido de emissão de CNH. Inviabilidade. Art. 148, § 3º, da Lei n. 9.503/1997. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, pela Corte Especial do STJ. AI no AREsp 641.185/RS. Acórdão cassado pelo STF no julgamento do segundo ARE 1.195.532/RS - AGR.

Ementa: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTROVÉRSIA A RESPEITO DA IMPOSSIBILIDADE DE O PROPRIETÁRIO QUE NÃO EFETUOU O REGISTRO DE VEÍCULO NO PRAZO ESTABELECIDO NA REDAÇÃO ORIGINAL DO ART. 233 DO CTB COMETER INFRAÇÃO DE NATUREZA GRAVE A INVIABILIZAR O SEU PEDIDO DE EMISSÃO DA CNH. ART. 148, § 3º, DA LEI N. 9.503/1997. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL, SEM REDUÇÃO DE TEXTO, PELA CORTE ESPECIAL DESTE TRIBUNAL SUPERIOR. AI NO ARESP N. 641.185/RS. ACÓRDÃO CASSADO PELO STF NO JULGAMENTO DO SEGUNDO ARE 1.195.532/RS - AgR. 1. O Supremo Tribunal Federal, com fundamento no art. 97 da CF e no enunciado da Súmula Vinculante n. 10, cassou acórdão proferido por este Colegiado e determinou o rejulgamento do recurso especial interposto pelo DETRAN/RS, no qual a controvérsia diz respeito à ofensa ao § 3º do art. 148 da Lei n. 9.503/1997 (CTB) e dissídio jurisprudencial sobre a referida norma. 2. O autor da ação, no exercício do seu direito como condutor de veículos (permissionário), pleiteou na via administrativa a expedição da Carteira Nacional de Habilitação - CNH junto ao DETRAN/RS, todavia foi-lhe negado o pedido em razão do cometimento de infração de natureza grave prevista na redação original do artigo 233 do CTB, pois deixou de efetuar, como proprietário, o registro do veículo junto ao órgão executivo de trânsito. A ação foi julgada procedente em primeira instância para que o DETRAN/RS confira ao autor a CNH e apelação da autarquia estadual foi desprovida. 3. Em sede de recuso especial o DETRAN/RS declara a ocorrência de afronta aos arts. 148, § 3º, e 233, da Lei n. 9.503/1997 (CTB), e dissídio jurisprudencial, ao argumento de que deve ser obstada a concessão de Carteira Nacional de Habilitação - CNH ao condutor que cometeu infração de natureza grave durante o período e m que era permissionário do direito de dirigir. 4. Registra-se a prejudicialidade da Questão de Ordem de fls. 398-400, na qual este Colegiado havia decidido pela remessa dos autos à Corte Especial, a fim de que fosse dado cumprimento ao que dispõem o artigo 97 da Constituição Federal e a Súmula Vinculante n. 10, no que se refere ao exame da declaração de (in)constitucionalidade do § 3º do artigo 148 do CTB. Isso porque a observância da compatibilidade da referida norma com o texto constitucional já foi realizada pelo Órgão Especial desta Corte, dispensando nova manifestação dos órgãos fracionários, nos termos do parágrafo único do artigo 949 do CPC e do § 1º do artigo 16 do RI/STJ. 5. A resolução da controvérsia foi inicialmente apreciada pela Corte Especial por meio da Arguição de Inconstitucionalidade do § 3º do artigo 148 da Lei n. 9.503/1997 (CTB), no julgamento do AI no ARESp n. 641.185/RS, Relator Ministro Og Fernandes, sessão de 11/2/2021. Na oportunidade, foi reconhecida, por unanimidade, a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, da norma contida no § 3º do artigo 148 "[...] para excluir sua aplicação à hipótese de infração (grave ou gravíssima) meramente administrativa, ou seja, não cometida na condução de veículo automotor". Ocorre que o acórdão da Corte Especial foi cassado pelo STF, por meio do julgamento do ARE 1.195.532 AgR-segundo, Primeira Turma, DJe de 21/10/2021, razão por que é necessário reconhecer que a norma contida no § 3º do artigo 148 da Lei n. 9.503/1997 - é aplicável, o que equivale dizer que, no caso, é lícito ao Órgão de trânsito indeferir o pedido de Carteira Nacional de Habilitação ao condutor que, portador da Permissão para Dirigir, cometeu infração grave, independentemente dessa infração ser qualificada como de natureza administrativa ou na condução do veículo. 6. Agravo conhecido para conhecer e dar provimento ao recurso especial do DETRAN/RS. (STJ. AREsp 584.752-RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 23/3/2023, DJe 29/3/2023 - Publicado no Informativo nº 769)