STF. ADPF 635 MC-ED/RJ

Tese Firmada: O Estado do Rio de Janeiro deve elaborar, no prazo máximo de 90 dias, um plano para redução da letalidade policial e controle das violações aos direitos humanos pelas forças de segurança, que apresente medidas objetivas, cronogramas específicos e previsão dos recursos necessários para a sua implementação.

Questão Jurídica: Plano de redução de letalidade policial e controle de violações de direitos humanos

Ementa: CONSTITUCIONAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MEDIDA CAUTELAR EM ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. OMISSÃO ESTRUTURAL DO PODER PÚBLICO NA ADOÇÃO DE MEDIDAS DE REDUÇÃO DA LETALIDADE POLICIAL. GRAVE VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS. NECESSIDADE DE ELABORAÇÃO DE PLANO PARA A REDUÇÃO DA LETALIDADE. DECISÃO DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. MORA INCONSTITUCIONAL. NECESSIDADE DA MEDIDA ESTRUTURAL. DEFERIMENTO DO PEDIDO. TRANSPARÊNCIA E PUBLICIDADE DOS PROTOCOLOS DE ATUAÇÃO POLICIAL. IMPOSIÇÃO CONSTITUCIONAL. DEFERIMENTO DO PEDIDO. MEDIDAS CAUTELARES ADICIONAIS PARA A GARANTIA DA DECISÃO COLEGIADA. PREVISÃO LEGAL EXPRESSA. INSTALAÇÃO DE CÂMERAS E GPS. DEFERIMENTO. PRESENÇA DE SERVIÇO DE SAÚDE NA REALIZAÇÃO DE GRANDES OPERAÇÕES. DEFERIMENTO. PROCEDIMENTO DE INVESTIGAÇÃO NO CASO DE DESCUMPRIMENTO DA MEDIDA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL E DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. EMBARGOS ACOLHIDOS. 1. A arguição de descumprimento de preceito fundamental, ao admitir diversas medidas de natureza cautelar, instrumentaliza a jurisdição constitucional para enfrentar os litígios estruturais que se configuram quando houver (i) uma violação generalizada de direitos humanos; (ii) uma omissão estrutural dos três poderes; e (iii) uma necessidade de solução complexa que exija a participação de todos os poderes. Isso porque é típico dessas ações a adoção de ordens flexíveis, com a manutenção da jurisdição, para assegurar o sucesso das medidas judiciais determinadas. Precedentes. 2. Embora já houvesse ordem da Corte Interamericana para a adoção de um plano de redução da letalidade policial, a mora no cumprimento da decisão foi agravada ante a restrição das operações policiais, já que não dispunha o Estado de parâmetro normatizado de proporcionalidade para a definição de casos de absoluta necessidade, o que justifica a readequação da cautelar apreciada, para determinar a elaboração, com a a indispensável participação da sociedade civil, de um plano que contenha medidas objetivas, cronogramas específicos e a previsão dos recursos necessários para a sua implementação. 3. Os Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, aprovados pelas Nações Unidas, são os limites mínimos que devem ser empregados para a atuação das forças policiais, quer em contextos de pandemia, quer em qualquer outro contexto. Precedentes. 4. A interpretação constitucionalmente adequada do direito à vida somente autorizaria o uso de força letal por agentes de Estado em casos extremos quando, (i) exauridos todos os demais meios, inclusive os de armas não-letais, ele for (ii) necessário para proteger a vida ou prevenir um dano sério, (iii) decorrente de uma ameça concreta e iminente. Em qualquer hipótese, colocar em risco ou mesmo atingir a vida de alguém somente será admissível se, após minudente investigação imparcial, feita pelo Ministério Público, concluir-se ter sido a ação necessária para proteger exclusivamente a vida – e nenhum outro bem – de uma ameaça iminente e concreta. Cabe às forças de segurança examinarem diante das situações concretas a proporcionalidade e a excepcionalidade do uso da força, servindo os princípios como guias para o exame das justificativas apresentadas a fortiori. 5. Os protocolos de atuação policial devem ser públicos e transparentes, porque asseguram a confiabilidade das instituições de aplicação da lei e amparam os agentes de Estado na sua atividade, dando a eles a necessária segurança jurídica de sua atuação. Só é possível avaliar a atuação policial caso se saiba com antecedência quais são precisamente os parâmetros que governam a atuação dos agentes de Estado. 6. Segundo a maioria do Colegiado, a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados. Vencido, no ponto, o Relator. 7. A existência de legislação que concreta e especificamente determina a aquisição e instalação de câmeras e equipamentos de GPS nos uniformes e viaturas policiais obriga que o Poder Executivo, máxime quando não assegure outras medidas de redução da letalidade, dê-lhe imediato cumprimento, garantido o acesso posterior às imagens pelo Ministério Público e observada a necessária priorização das unidades de polícia responsáveis pelas operações nas comunidades pobres. 8. A imposição legal e a exigência de prestação de serviços médicos aos feridos em decorrência da atuação dos agentes de segurança do Estado obriga a disponibilização de ambulâncias em operações policiais previamente planejadas em que haja a possibilidade de confrontos armados. 9. Embargos de declaração acolhidos em parte. (ADPF 635 MC-ED, Relator(a): EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 03/02/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-101 DIVULG 25-05-2022 PUBLIC 26-05-2022 REPUBLICAÇÃO: DJe-108 DIVULG 02-06-2022 PUBLIC 03-06-2022)