STJ. REsp 1.976.743-SC

Enunciado: As regras que estabelecem hipóteses de impenhorabilidade não são absolutas. O próprio art. 3º da Lei n. 8.009/1990 prevê uma série de exceções à impenhorabilidade, entre as quais está a hipótese em que a ação é movida para cobrança de crédito decorrente de financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato (inciso II). A controvérsia reside sobre a aplicação desse dispositivo legal à dívida relativa ao contrato de empreitada global, por meio do qual o empreiteiro se obriga a construir a obra e a fornecer os materiais. Esta Corte Superior já se manifestou, em diversas oportunidades, no sentido de que a exceção prevista no art. 3º, II, da Lei n. 8.009/1990 se aplica à dívida oriunda do contrato de compra e venda do imóvel. O fundamento central dessa conclusão está relacionado ao intuito do legislador ao prever a exceção legal ora tratada, que foi de evitar que aquele que contribuiu para a aquisição ou construção do imóvel ficasse impossibilitado de receber o seu crédito. Esta Terceira Turma decidiu que a exceção prevista no art. 3º, II, da Lei n. 8.009/1990 também incide à hipótese de dívida contraída para aquisição de terreno sobre o qual o devedor edificou, com recursos próprios, a casa que serve de residência da família. Nesse cenário, é nítida a preocupação do legislador no sentido de impedir a deturpação do benefício legal, vindo a ser utilizado como artifício para viabilizar a aquisição, melhoramento, uso, gozo e/ou disposição do bem de família sem nenhuma contrapartida, à custa de terceiros. Portanto, a dívida relativa a contrato de empreitada global, porque viabiliza a construção do imóvel, está abrangida pela exceção prevista no art. 3º, II, da Lei n. 8.009/1990.

Tese Firmada: Admite-se a penhora do bem de família para saldar o débito originado de contrato de empreitada global celebrado para promover a construção do próprio imóvel.

Questão Jurídica: Construção de imóvel. Débito originado de contrato de empreitada global. Bem de família. Penhora. Possibilidade.

Ementa: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DÍVIDA DECORRENTE DE CONTRATO DE EMPREITADA GLOBAL. BEM DE FAMÍLIA. PENHORA. POSSIBILIDADE. ART. 3º, II, DA LEI 8.009/90. DESMEMBRAMENTO DO IMÓVEL. CERCEAMENTO DE DEFESA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. JULGAMENTO: CPC/2015. 1. Recurso especial interposto em 24/03/2021 e concluso ao gabinete em 22/11/2021. 2. O propósito recursal consiste em definir se a exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no art. 3º, II, da Lei 8.009/90 se aplica à dívida decorrente de contrato de empreitada global celebrado para viabilizar a edificação do imóvel. 3. As regras que estabelecem hipóteses de impenhorabilidade não são absolutas. O próprio art. 3º da Lei nº 8.009/90 prevê uma série de exceções à impenhorabilidade, entre as quais está a hipótese em que a ação é movida para cobrança de crédito decorrente de financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato (inciso II). 4. Da exegese comando do art. 3º, II, da Lei nº 8.009/90, fica evidente que a finalidade da norma foi coibir que o devedor se escude na impenhorabilidade do bem de família para obstar a cobrança de dívida contraída para aquisição, construção ou reforma do próprio imóvel, ou seja, de débito derivado de negócio jurídico envolvendo o próprio bem. Portanto, a dívida relativa a contrato de empreitada global, porque viabiliza a construção do imóvel, está abrangida pela exceção prevista no art. 3º, II, da Lei nº 8.009/90. 5. A ausência de decisão acerca de dispositivo legal apontado como violado - na hipótese, o art. 269 do CPC/2015 - impede o conhecimento do recurso especial quanto ao ponto. 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido, sem majoração de honorários. (STJ. REsp 1.976.743-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, TerceiraTurma, por unanimidade, julgado em 08/03/2022, DJe 11/03/2022 - Publicado no Informativo nº 728)