STJ. AgInt no REsp 1.933.552-ES
Enunciado: Inicialmente, ressalta-se que a Terceira Turma recentemente remodelou a sua compreensão acerca do tema atinente ao ressarcimento do usuário pela utilização de serviços da rede não credenciada, estabelecendo, contudo, não o ressarcimento integral mas nos limites da tabela do plano de saúde contratado. Da ementa do mencionado julgado, extrai-se que "6. Se a operadora de plano de saúde é obrigada a ressarcir o SUS na hipótese de tratamento em hospital público, não há razão para deixar de reembolsar o próprio beneficiário que se utiliza dos serviços do hospital privado que não faz parte da sua rede credenciada. 7. O reembolso das despesas efetuadas pelo beneficiário com assistência à saúde deve ser permitido quando não for possível a utilização dos serviços próprios, contratados, credenciados ou referenciados pelas operadoras, sendo as hipóteses de urgência e emergência apenas exemplos (e não requisitos) dessa segurança contratual dada aos consumidores. (REsp 1.575.764/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 07/05/2019, DJe 30/05/2019) Estabelece-se como norte hermenêutico para a interpretação da lei a inegável incidência do diploma consumerista à relação mantida entre beneficiário/usuário e operadora de plano de saúde (art. 35-G da Lei n. 9.656/1988), salvo aqueles de autogestão, que não é o caso. Nessa toada, em observância aos princípios previstos no Código de Defesa do Consumidor, notadamente a boa-fé objetiva, que, inclusive, deve guiar a elaboração e a execução de todos os contratos, e a interpretação sempre em benefício do hipossuficiente, não se afigura razoável que na hipótese da enfermidade estar coberta pelo plano de saúde e de não ser possível a utilização dos serviços próprios, contratados, credenciados ou referenciados pelas operadoras, seja no limite do município ou fora da área de abrangência municipal, o reembolso das despesas realizadas pelo usuário somente possa se dar em caso de urgência ou emergência - em que pese seja essa a hipótese dos autos -, haja vista que se o tratamento da enfermidade é coberto pelo contrato mantido com a operadora, acaso houvessem profissionais e clínicas no limite geográfico da municipalidade estaria o plano obrigado a suportar, ao menos, a cobertura consoante contratado. Com base nessa assertiva, de que o tratamento da doença é coberto, abre-se ao usuário três possibilidades distintas com consequências bem definidas: a) fazer uso do SUS, oportunidade na qual o Estado demandará a operadora do reembolso integral, nos limites do contrato; b) deslocar-se para município ou área geográfica limítrofe e ser atendido por profissional ou clínica conveniada, tendo direito a traslado (ida e volta), nos termos da resolução de regência, e, em caso de descumprimento por parte da operadora (de fornecimento do traslado), terá o direito de ser reembolsado integralmente nos termos do artigo 9º da Resolução n. 268/2011 caso o beneficiário tenha sido obrigado a pagar os custos do atendimento e c) utilizar-se de profissionais/estabelecimentos não conveniados/referenciados pelo plano, seja no âmbito da extensão geográfica ou fora dela, ficando o ressarcimento limitado ao valor de tabela do plano contratado. Nessa última hipótese, não se cogita em violação ao equilíbrio atuarial da operadora - afinal está contratualmente obrigada ao tratamento da doença coberta -, mas em interpretação que a um só tempo mantém as estipulações pactuadas e garante ao usuário o atendimento de que necessita para o tratamento da enfermidade. A limitação de reembolso ao valor de tabela afasta qualquer possibilidade de enriquecimento indevido do usuário ao se utilizar de profissional ou hospital de referência que muitas vezes demandam altas somas pelo trabalho desempenhado. Assim, a limitação do reembolso ao usuário pelo preço de tabela, quando não for hipótese de descumprimento pela operadora de conceder traslado e demais benefícios, é medida que se impõe quando o usuário utilizar, para o tratamento de terapia coberta, os profissionais e estabelecimentos não credenciados, estejam eles dentro ou fora da área de abrangência do município/área geográfica e de estar ou não o paciente em situação de emergência/urgência.
Tese Firmada: É devida a limitação do reembolso, pelo preço de tabela, ao usuário que utilizar para o tratamento de terapia coberta, os profissionais e estabelecimentos não credenciados, estejam eles dentro ou fora da área de abrangência do município/área geográfica e de estar ou não o paciente em situação de emergência ou urgência.
Questão Jurídica: Plano de saúde. Tratamento previsto na cobertura. Profissionais e estabelecimentos não credenciados. Reembolso pelo usuário. Cabimento. Limitação. Preço de tabela.
Ementa: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - PLANO DE SAÚDE - NEGATIVA INDEVIDA DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO DE COLOCAÇÃO DE MARCA-PASSO - TRATAMENTO DE URGÊNCIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECLAMO DA OPERADORA PARA JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS NA INICIAL - INSURGÊNCIA DO AUTOR - AGRAVO INTERNO PROVIDO. 1. Depreende-se dos autos que: a) o procedimento cirúrgico de colocação de marcapasso era considerado imprescindível para o tratamento da enfermidade acometida pelo autor; b) a cirurgia era de ser realizada com urgência, pois a manutenção do quadro decorrente das arritmias acarretava risco à vida do paciente; e, c) a negativa de cobertura foi considerada indevida. 2. As alegações da parte ré, nas razões do recurso especial, segundo as quais o tratamento, supostamente sem conformidade técnica, teria sido realizado em rede não credenciada e fora da área de abrangência, bem ainda que o procedimento de colocação do marcapasso não estaria coberto diante de cláusula contratual expressa, refogem aos limites da moldura fática delineada pelas instâncias ordinárias, constituindo indevida inovação recursal. 2.1 Tais teses desbordam do objeto da análise a ser realizada por esta Corte Superior, pois, para tanto, seria necessário se imiscuir no quadro fático ensejador do conflito entre as partes, e, também, averiguar o conteúdo de cláusulas contratuais, mecanismos que a um só tempo ensejam inegável supressão de instância e violam os ditames das Súmulas 5 e 7/STJ. 3. Consoante entendimento sedimentado no STJ, o reembolso das despesas médico-hospitalares efetuadas pelo beneficiário fora da rede credenciada somente pode ser admitido em hipóteses excepcionais, que compreendam a inexistência ou insuficiência de serviço credenciado no local - por falta de oferta ou em razão de recusa indevida de cobertura do tratamento -, bem como urgência ou emergência do procedimento, observadas as obrigações contratuais e excluídos os valores que excederem a tabela de preços praticados no respectivo produto. 3.1 No caso concreto, além de se presumir que a enfermidade estava coberta pelo plano de saúde, pois a matéria sequer fora debatida na origem, o procedimento cirúrgico em questão se revestia de urgência/emergência, tendo a operadora negado o tratamento da enfermidade (recusa indevida), razão pela qual é cabível o reembolso pleiteado, no limite da tabela de preços do plano, excluídas as despesas que refogem à cobertura contratual, tais como referentes a hospedagem, transporte e alimentação. 4. O dano moral inicialmente fixado em R$ 100.000,00 (cem mil reais) foi reduzido pela Corte local para R$ 10.000,00 (dez mil reais), ante a recusa sistemática e indevida do plano de saúde no custeio e liberação do tratamento cirúrgico necessário à manutenção da vida do paciente, portanto, com caráter de urgência/emergência. Tal montante é condizente com o abalo sofrido pelo autor e encontra-se nos limites da razoabilidade e proporcionalidade. 4.1 Para modificar as conclusões consignadas no acórdão impugnado e concluir estar exagerado o quantum indenizatório como quer a operadora do plano de saúde, seria necessária a incursão no conjunto fático-probatório das provas e nos elementos de convicção dos autos, o que é vedado em sede de recurso especial (Súmula nº 7 do STJ). 5. Agravo interno provido para conhecer em parte do recurso especial da operadora do plano de saúde e, nessa extensão, dar-lhe parcial provimento, mantendo a determinação das instâncias ordinárias quanto ao dever de reembolsar as despesas médico-hospitalares realizadas pelo autor, excluídos os valores que excederem os preços de tabela do plano, bem como os custos com hospedagem, transporte e alimentação, conforme contrato estabelecido entre as partes. (STJ. AgInt no REsp 1.933.552-ES, Rel. Min. Luis FelipeSalomão, Rel. Acd. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por maioria, julgado em 15/03/2022 - Publicado no Informativo nº 729)