STJ. REsp 1.987.108-MG

Enunciado: Acerca da interpretação ao art. 200 do diploma civil, merece registro que, consoante abalizada doutrina, trata-se de "causa especial de suspensão de prescrição", na medida em que impede o transcurso do tempo necessário para a extinção da pretensão pela inércia do interessado. A aplicação do mencionado dispositivo legal tem campo, justamente, quando existe uma relação de prejudicialidade entre as esferas cível e penal. Quer dizer que a independência entre tais instâncias não é absoluta, porquanto não é possível indagar a existência do fato e sua autoria no juízo cível quando estas questões se acharem decididas na esfera penal (art. 935 do CC/2002), assim como também quando nesta for reconhecida causa excludente de ilicitude, dentre os quais o estado de necessidade, a legítima defesa, o estrito cumprimento de dever legal e o exercício regular de um direito (art. 65 do CPP). Acerca do assunto, esta Corte já decidiu reiteradas vezes que "a aplicação do art. 200 do CC/2002 tem valia quando houver relação de prejudicialidade entre as esferas cível e penal - isto é, quando a conduta originar-se de fato também a ser apurado no juízo criminal -, sendo fundamental a existência de ação penal em curso (ou ao menos inquérito policial em trâmite)"(REsp 1.135.988/SP, 4ª Turma, DJe 17/10/2013). A finalidade, pois, do preceituado no art. 200 do CC/2002 é evitar a possibilidade de soluções contraditórias entre as duas searas, especialmente quando a solução do processo penal seja determinante do resultado do processo cível. Por isso, permite-se à vítima aguardar a solução da ação penal para apenas depois ajuizar a demanda indenizatória na esfera cível (REsp 1.180.237/MT, 3ª Turma, DJe 22/06/2012). Não se descura, também, da utilidade do disposto no mencionado preceito legal quando o ofendido desconhece as circunstâncias concretas em que se deu o evento danoso, ou mesmo a identificação de todos os responsáveis pela sua ocorrência. Vale ressaltar que a causa de suspensão da prescrição consagrada na previsão normativa em comento aplica-se às vítimas do delito a ser apurado na esfera penal, de forma a serem favorecidas, uma vez que terão a faculdade de aguardar o desfecho do processo criminal para promover a pretensão indenizatória na esfera cível (ação ex delicto). É importante esclarecer, ainda, que o art. 200 do CC/2002 incidirá independentemente do resultado alcançado na esfera criminal. Na mesma linha de ideias, a doutrina destaca que "o legislador não discrimina critério diverso para a hipótese de sentença penal absolutória, com responsabilidade civil apenas residual; não negado o fato ou a sua autoria, a prescrição correrá da sentença definitiva". Tal entendimento prestigia a boa-fé objetiva, impedindo que o prazo prescricional para deduzir a pretensão reparatória se inicie previamente à apuração definitiva do fato no juízo criminal, criando uma espécie legal de actio nata.

Tese Firmada: O art. 200 do CC/2002 assegura que o prazo prescricional não comece a fluir antes do trânsito em julgado da sentença penal, independentemente do resultado da ação na esfera criminal.

Questão Jurídica: Prescrição. Termo inicial. Trânsito em julgado da ação penal. Relação de prejudicialidade. Art. 200 do Código Civil. Causa suspensiva. Incidência.

Ementa: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO DE DANOS MORAIS. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO. AÇÃO PENAL. INCIDÊNCIA DA CAUSA SUSPENSIVA DO ART. 200 DO CC/02. MULTAS. AGRAVO INTERNO MANIFESTAMENTE INADMISSÍVEL E EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROTELATÓRIOS. NULIDADE. AUSÊNCIA. 1. Ação indenizatória proposta em 07/03/2017, da qual foi extraído o presente recurso especial interposto em 03/03/2020 e concluso ao gabinete em 28/12/2021. 2. O propósito recursal é definir se a) houve negativa de prestação jurisdicional, b) houve a suspensão do prazo prescricional para a propositura da ação compensatória, nos termos do art. 200 do CC/2002 e c) as multas aplicadas por recursos protelatórios são válidas. 3. É firme a jurisprudência do STJ no sentido de que não há ofensa ao art. 1.022 do CPC/15 quando o Tribunal de origem, aplicando o direito que entende cabível à hipótese, soluciona integralmente a controvérsia submetida à sua apreciação, ainda que de forma diversa daquela pretendida pela parte. 4. "A aplicação do art. 200 do CC/02 tem valia quando houver relação de prejudicialidade entre as esferas cível e penal - isto é, quando a conduta originar-se de fato também a ser apurado no juízo criminal -, sendo fundamental a existência de ação penal em curso (ou ao menos inquérito policial em trâmite)" (REsp 1.135.988/SP). A finalidade, pois, dessa norma, é evitar a possibilidade de soluções contraditórias entre as duas searas, especialmente quando a solução do processo penal seja determinante do resultado do processo cível. 5. O art. 200 do CC/02 incidirá independentemente do resultado alcançado na esfera criminal. Tal entendimento prestigia a boa-fé objetiva, impedindo que o prazo prescricional para deduzir a pretensão reparatória se inicie previamente à apuração definitiva do fato no juízo criminal, criando uma espécie legal de actio nata. 6. Na espécie, houve a propositura de ação penal, na qual foi declarada a ilegitimidade ativa do Ministério Público em relação a um dos delitos e o réu foi absolvido do outro. Tais circunstâncias, todavia, não afastam a incidência do art. 200 do CC/02, remanescendo hígida a pretensão. 7. Não há que se falar em nulidade quando as previstas nos arts. 1.021, § 4º e 1.026, § 2º, do CPC/2015 são aplicadas em decisão devidamente fundamentada. 8. Recurso especial conhecido e não provido. (STJ. REsp 1.987.108-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 29/03/2022, DJe 01/04/2022 - Publicado no Informativo nº 732)