STJ. REsp 1.976.741-RJ

Enunciado: Discute-se a validade da citação de pessoa jurídica por carta dirigida a local onde não mais se encontra estabelecida a sua sede, conquanto entregue em endereço apontado no sítio eletrônico disponibilizado na internet. A verificação da validade da citação deve levar em conta a importância do ato, especialmente à luz dos direitos e garantias que envolvem o sistema processual. Justamente em razão da estreita ligação entre a citação e o exercício das garantias processuais do contraditório e da ampla defesa, o formalismo desse ato de comunicação assume papel fundamental e não pode ser afastado. Diante da dificuldade de o carteiro verificar quem ostenta poderes para representar a pessoa jurídica, a jurisprudência desta Corte sedimentou-se no sentido de que a citação é válida quando a carta for recebida por quem se apresenta como responsável pela empresa, sem ressalvas quanto à inexistência de poderes de representação. A partir da doutrina e da jurisprudência sobre essa teoria, conclui-se que devem ser preenchidos dois requisitos básicos para que a citação seja considerada válida: 1°) entrega do mandado ou da carta de citação no endereço da pessoa jurídica; e 2°) recebimento do mandado ou da carta por funcionário da pessoa jurídica, mesmo que não seja seu representante, não faça qualquer ressalva quanto à inexistência de poderes de representação. No caso, não foi preenchido o primeiro requisito, pois a carta de citação foi entregue em endereço no qual a recorrente não mais mantinha a sua sede. Por outro lado, não é possível concluir pelo preenchimento do segundo requisito, dado que não foi constatado, pelo Tribunal a quo, se o recebedor da carta teria algum vínculo com a recorrente ou se era porteiro do edifício comercial onde a empresa outrora manteve a sua sede. Independentemente dos deveres que devem ser observados no âmbito das relações de direito material e, evidentemente, não se olvidando da observância da boa-fé objetiva também na seara processual, é ônus do autor informar o endereço correto do réu, a fim de viabilizar a prática correta dos atos de comunicação processual, nos termos do artigo 282 do CPC 1973 e do artigo 319, II, do CPC2015. Ressalte-se que a recorrente cumpriu a obrigação legal de registro da alteração do contrato social com o novo endereço, nos termos do artigo 32 da Lei n. 8.934/1994, garantindo-se a publicidade da modificação e, portanto, o acesso da autora a tal informação. Ao cuidar do dever de informar endereços para a prática de atos de comunicação processual, a Lei é bastante cautelosa e específica. Para a citação por meio eletrônico, por exemplo, não é válido todo e qualquer endereço propagado pelo jurisdicionado, inclusive aquele publicado pelas pessoas jurídicas perante clientes e parceiros comerciais nos sítios eletrônicos da rede mundial de computadores. É necessário observar o endereço eletrônico cadastrado especificamente para tal finalidade. Com efeito, a Lei n. 11.419/2006 já exigia que as citações por meio eletrônico fossem realizadas por meio de endereço previamente cadastrado nos Tribunais. Ademais, o envio da carta de citação a endereço diverso daquele em que estava estabelecida a recorrente à época do ato, a par de revelar a ausência do primeiro requisito para a aplicação da teoria da aparência, induz à conclusão de que também estava ausente o segundo, porquanto se presume que o recebedor da carta não era funcionário da citanda. E isto, por si só, também invalida o ato citatório. Ressalte-se que não existe norma jurídica prevendo qualquer tipo de presunção de validade de citação encaminhada a endereço desatualizado e, como se trata de ato processual de suma importância para o exercício do contraditório e da ampla defesa, não é lícita qualquer citação ficta além daquelas expressamente previstas em lei (citação por hora certa e citação por edital).

Tese Firmada: Não é possível considerar válida a citação de pessoa jurídica em seu antigo endereço, cuja mudança fora comunicada à Junta Comercial, mas sem alteração no sítio eletrônico da empresa.

Questão Jurídica: Citação. Pessoa Jurídica. Mudança de endereço comunicada à junta comercial. Ausência de atualização do endereço no sítio eletrônico da internet. Carta citatória entregue no endereço antigo. Nulidade. Inaplicabilidade da teoria da aparência.

Ementa: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CITAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. MUDANÇA DE ENDEREÇO COMUNICADA À JUNTA COMERCIAL. AUSÊNCIA DE ATUALIZAÇÃO DO ENDEREÇO NO SÍTIO ELETRÔNICO DA INTERNET. CARTA CITATÓRIA ENTREGUE NO ENDEREÇO ANTIGO. NULIDADE. RECONHECIMENTO. INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA APARÊNCIA NA HIPÓTESE. 1. Controvérsia em torno da validade da citação de pessoa jurídica em seu antigo endereço, cuja mudança fora comunicada à Junta Comercial, mas sem alteração no sítio eletrônico da empresa. 2. Extrema relevância da regularidade formal do ato citatório por sua primordial importância na formação da relação processual. 3. Não preenchimento dos requisitos para aplicação da teoria da aparência. 4. Precedentes da Terceira Turma do STJ. 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (STJ. REsp 1.976.741-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/04/2022 - Publicado no Informativo nº 734)