STJ. REsp 1.990.221-SC

Enunciado: O art. 122 do CC/2002 afirma ser ilícita a condição que sujeita a eficácia do negócio jurídico ao puro arbítrio de uma das partes, interditando como defesas, em suma, as condições puramente potestativas. Uma primeira leitura desse dispositivo legal pode dar a entender que a sujeição da eficácia do negócio jurídico ao arbítrio de qualquer das partes será, sempre e em qualquer hipótese, suficiente para qualificar como ilícita a condição assim estabelecida. No entanto, somente quando o próprio devedor se reserva o direito de caprichosamente descumprir a obrigação assumida é que sobressai, de fato, o arbítrio da parte como elemento exclusivo para subordinar a eficácia do ato/negócio. Realmente o estabelecimento, em favor do devedor, de uma cláusula do tipo "se me aprouver", "se eu quiser", configura quase um gracejo, um chiste lançado pela parte com aptidão para afastar por completo a seriedade do negócio jurídico. Quem escuta uma proposição dessa espécie nem mesmo leva a sério o ajuste que se lhe apresenta, pois na verdade o proponente não se obrigou a nada. A jurisprudência desta Corte parece seguir esse mesmo entendimento, afirmando que apenas as condições (puramente) potestativas estabelecidas em proveito do devedor devem ser consideradas defesas. No caso, a estipulação assinalada mais se assemelha a termo incerto ou indeterminado do que, propriamente, a condição potestativa. E mesmo admitindo tratar-se de condição, seria de rigor verificar que ela beneficiava ao credor e não ao devedor, não havendo falar, por isso, em falta de seriedade na proposta ou risco à estabilidade das relações jurídicas. Ademais, foi estatuída em consideração a uma circunstância fática alheia à vontade das partes: o resultado de uma determinada ação judicial (usucapião), havendo, assim, interesse juridicamente relevante a justificar sua estipulação. Desse modo a condição não teria natureza puramente potestativa, mas meramente potestativa, devendo, em consequência, ser considerada válida, até mesmo para efeito de impedir a fluência do prazo prescricional.

Tese Firmada: Pode ser válida a estipulação que confira ao credor a possibilidade de exigir, "tão logo fosse de seu interesse", a transferência da propriedade de imóvel.

Questão Jurídica: Condição meramente potestativa. Interesse do credor. Possibilidade. Transferência da propriedade de imóvel. Estipulação "tão logo fosse de seu interesse" em favor do credor. Termo incerto ou indeterminado. Validade.

Ementa: DIREITO CIVIL. CONTRATOS. CONDIÇÃO SUSPENSIVA MERAMENTE POTESTATIVA. VALIDADE. SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA RETOMADA DO JULGAMENTO DAS APELAÇÕES. 1. As disposições do NCPC, no que se refere aos requisitos de admissibilidade dos recursos, são aplicáveis ao caso concreto ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016. 2. Discute-se nos autos a validade de estipulação que conferia ao credor a possibilidade de exigir, "tão logo fosse de seu interesse", a transferência da propriedade de imóvel. 3. O art. 122 do CC/02 (correspondente ao art. 115 do CC/16) proíbe as condições puramente potestativas, assim compreendidas como aquelas que sujeitam a eficácia do negócio jurídico ao puro arbítrio de uma das partes, comprometendo a seriedade do acordo e depondo contra a boa-fé objetiva. 4. No caso, a estipulação assinalada mais se assemelha a termo incerto ou indeterminado do que, propriamente, a condição potestativa. 5. E mesmo admitindo tratar-se de condição, seria de rigor verificar quem ela beneficiava (credor e devedor), não havendo falar, por isso, em falta de seriedade na proposta ou risco à estabilidade das relações jurídicas. 6. Ademais, foi estatuída em consideração a uma circunstância fática alheia à vontade das partes: o resultado de uma determinada ação judicial (usucapião), havendo, assim, interesse juridicamente relevante a justificar sua estipulação. 7. Desse modo a condição não seria inútil ou inconveniente e, em consequência, pode ser considerada válida, até mesmo para efeito de impedir a fluência do prazo prescricional. 8. Recurso especial provido com determinação de retorno dos autos à origem para prosseguir no julgamento dos recursos de apelação. (STJ. REsp 1.990.221-SC, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 03/05/2022 - Publicado no Informativo nº 735)