- TJ-SP
- STF
- STJ
-
TST
- Súmulas
- Orientações Jurisprudenciais
- Precedentes normativos
- TSE
- JEFs
- CJF
STJ. REsp 1.708.325-RS
Enunciado: A responsabilidade civil estatal é, em regra, objetiva e decorre do risco administrativo, a respeito da qual não se exige perquirir sobre existência de culpa, conforme disciplinado pelos arts. 14 do Código de Defesa do Consumidor; 186, 192 e 927 do Código Civil; e 37, § 6º, da Constituição Federal. O dualismo ocorre diante dos atos omissivos, para os quais, embora a lei não tenha feito distinção, há os que entendem que, para o ente público, a responsabilidade se reveste do caráter subjetivo. Na toada, entretanto, de que, conforme assevera a doutrina, "não é dado ao intérprete restringir onde o legislador não restringiu, sobretudo em se tratando de legislador constituinte", esta Corte, em diversos julgados, tem procurado alinhar-se ao entendimento do Excelso Pretório de que - inclusive por atos omissivos - o Poder Público responde de forma objetiva, quando constatada a precariedade/vício no serviço decorrente da falha no dever legal e específico de agir. No caso, trata-se de responsabilidade civil atribuída a hospital, em que a atividade pública exercida, por sua natureza, inclui, além do serviço técnico-médico, o serviço auxiliar de estadia e, por tal razão, está o ente público obrigado a disponibilizar equipe/pessoal e equipamentos necessários e eficazes para o alcance dessa finalidade. A inação estatal está atrelada ao mau funcionamento dos trabalhos auxiliares e estruturas operacionais (ausência de serviço/pessoal de vigilância), razão pela qual entende-se que o ente público, em virtude da natureza da atividade pública exercida, responde de forma objetiva, uma vez que, inegavelmente, tem o dever de atuar, ao menos minimamente, para impossibilitar a ocorrência do evento nocivo. A omissão do Estado no presente feito revela-se específica e contribuiu decisivamente para a morte da vítima, pois o hospital público não ofereceu nenhuma ou sequer a mínima garantia de integridade aos que se utilizam do serviço e pela qual, em razão do risco da atividade prestada, tem o dever de zelo e proteção. Ocorre que a responsabilidade civil do Estado, todavia - seja de ordem subjetiva, seja objetiva - depende, para a configuração da ocorrência de seus pressupostos, do ato ilícito, do dano sofrido e do nexo de causalidade entre o evento danoso e a ação ou omissão do agente público. Estão descritos na sentença e no acórdão, a saber: (a) o hospital não possui nenhum serviço de vigilância; e (b) o evento morte decorreu de um disparo com arma de fogo contra a vítima dentro do hospital. O Tribunal regional - a despeito de a vítima ter sido baleada e o óbito ter ocorrido no interior do hospital -, não considerou o fato de não existir serviço de vigilância; ao contrário, a Corte local afirma, categoricamente, que o serviço do hospital é somente o atendimento médico, razão pela qual estaria desobrigado de prestar segurança aos pacientes. Concluiu-se, assim, que a morte da vítima deu-se por fato de terceiro. Como observa-se, a Corte regional - embora tenha considerado não existir equipe responsável pela integridade física dos pacientes e transeuntes no local - afastou a responsabilidade civil, consignando, com base na teoria da causalidade adequada, que a ação de alguém mal intencionado, dentro do hospital público, teria o condão de romper o nexo de causalidade entre a conduta do hospital e o evento danoso. Acaso se estivesse diante de um atentado de grandes proporções, não seria difícil concluir que, não obstante todo o empenho, o ente público não pudesse, de fato, impedir o resultado. Esta, entretanto, não é a situação narrada no acórdão, que traz, ao contrário, contexto e narrativa simples e bem menos eloquente. Neste caso, a causalidade decorre da própria lógica hermenêutica e análise holística das disposições civis e constitucionais mencionadas, devendo ser examinada à luz dos referidos dispositivos. A causalidade no âmbito da responsabilidade civil objetiva deve ser entendida de forma normativa, uma vez que a relevância jurídica do não-fazer está inserida na própria norma se encontra perfectibilizado o liame subjetivo entre a conduta omissa do hospital e o evento morte. Há de se ressaltar, contudo, que esse entendimento não se aplica indistintamente a qualquer ato derivado de conduta omissiva da administração pública. Neste feito, sob as lentes do bom senso, o não-fazer do ente público no seu dever de cuidado é sobremaneira significativo. Mostra-se lógico concluir que uma mínima ação de vigilância e cuidado poderia efetivamente ter evitado a morte da vítima. A análise da responsabilidade civil, no contexto desafiador dos tempos modernos, em que se colocam a julgamento as consequências tão impactantes das omissões estatais, impõe o ônus, indispensável, de que o exame dos dispositivos civis referidos ocorra sob o olhar dos direitos e garantias fundamentais do cidadão. Logo, é de se concluir que a conduta do hospital que deixa de fornecer o mínimo serviço de segurança e, por conseguinte, despreza o dever de zelar pela incolumidade física dos seus pacientes contribuiu de forma determinante e específica para o homicídio praticado em suas dependências, afastando-se a alegação da excludente de ilicitude, qual seja, fato de terceiro.
Tese Firmada: O hospital que deixa de fornecer o mínimo serviço de segurança, contribuindo de forma determinante e específica para homicídio praticado em suas dependências, responde objetivamente pela conduta omissiva.
Questão Jurídica: Responsabilidade civil do Estado por omissão. Morte em decorrência de disparo de arma de fogo no interior de hospital público. Ausência de vigilância. Falha específica no dever de agir. Excludente de ilicitude. Fato de terceiro. Não ocorrência.
Ementa: ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO. MORTE EM DECORRÊNCIA DE DISPARO DE ARMA DE FOGO NO INTERIOR DE HOSPITAL PÚBLICO. AUSÊNCIA DE VIGILÂNCIA. FALHA ESPECÍFICA NO DEVER DE AGIR. EXCLUDENTE DE ILICITUDE. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A responsabilidade civil estatal é, em regra, objetiva, uma vez que decorre do risco administrativo, em que não se exige perquirir sobre existência de culpa, conf orme disciplinado pelos arts. 14 do Código de Defesa do Consumidor; 186, 192 e 927 do Código Civil; e 37, § 6º, da Constituição Federal. 2. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se ao entendimento do Excelso Pretório, firmou compreensão de que o Poder Público, inclusive por atos omissivos, responde de forma objetiva quando constatada a precariedade/vício no serviço decorrente da falha no dever legal e específico de agir. 3. A atividade exercida pelos hospitais, por sua natureza, inclui, além do serviço técnico-médico, o serviço auxiliar de estadia e, por tal razão, está o ente público obrigado a disponibilizar equipe/pessoal e equipamentos necessários e eficazes para o alcance dessa finalidade. 4. A análise da responsabilidade civil, no contexto desafiador dos tempos modernos, em que se colocam a julgamento as consequências impactantes das omissões estatais, impõe ao julgador o ônus preponderante de examinar os dispositivos civis referidos, sob o olhar dos direitos e garantias fundamentais do cidadão. 5. Logo, é de se concluir que a conduta do hospital que deixa de fornecer o mínimo serviço de segurança e, por conseguinte, despreza o dever de zelar pela incolumidade física dos pacientes, contribuiu de forma determinante e específica para o homicídio praticado em suas dependências, afastando-se a alegação da excludente de ilicitude, qual seja, fato de terceiro. 6 . Recurso especial provido para restabelecer a indenização, pelos danos morais e materiais, fixada na sentença. (STJ. REsp 1.708.325-RS, Rel. Min. Og Fernandes, SegundaTurma, por unanimidade, julgado em 24/05/2022 - Publicado no Informativo nº 740)