STJ. REsp 1.998.631-BA

Enunciado: A controvérsia suscitada no presente recurso cinge-se à natureza do crime tipificado no art. 2º da Lei n. 8.176/1991: se é delito permanente (cuja consumação se protrai no tempo) ou instantâneo, de forma que a reiteração da conduta (nas condições previstas no art. 71 do CP) pode da azo à incidência da majorante referente à continuidade delitiva. A diferença entre o crime instantâneo e o permanente estabelece-se a partir do lapso temporal em que verificada a consumação delitiva. Assim, enquanto no primeiro não se verifica um prolongamento da atividade delitiva, sendo quase que imediata a prática do verbo nuclear do tipo e o resultado (lesão do bem jurídico), no segundo, a própria natureza do bem jurídico tutelado no tipo viabiliza um prolongamento da consumação, de modo que a conduta delitiva se protrai no tempo, só cessando por vontade do autor. Ora, o crime sob exame, na modalidade de usurpação por exploração de matérias-primas pertencentes à União, envolve, via de regra, uma ação contínua do agente no sentido de explorar o recurso mineral objeto de usurpação, notadamente porque essa exploração só é possível mediante a prática de múltiplas condutas que vão além da extração em si. Assim, é possível cogitar de prolongamento da consumação mesmo que diante da extração interrompida, mas com manutenção de maquinário e de uma estrutura no local visando o transporte, beneficiamento e retomada da atividade extrativa em curto prazo. Com efeito, considerando a natureza da atividade, é possível concluir que, enquanto verificada essa exploração, ou seja, a prática de múltiplas condutas visando a extração do bem mineral, sem evidência de que o agente ativo intencionalmente cessou a atividade, a hipótese é de crime permanente.

Tese Firmada: É hipótese de crime permanente, a conduta tipificada no art. 2º da Lei n. 8.176/1991, na modalidade de usurpação por exploração de matérias-primas pertencentes à União, enquanto verificada a prática de múltiplas condutas visando a extração do bem mineral, sem evidência de que o agente ativo intencionalmente cessou a atividade extrativa.

Questão Jurídica: Usurpação de recurso mineral da União. Modalidade por exploração. Incidência da majorante referente à continuidade delitiva. Natureza jurídica. Caráter permanente ou instântaneo. Prática de múltiplas condutas. Ação contínua. Não incidência da majorante.

Ementa: RECURSO ESPECIAL. USURPAÇÃO DE RECURSO MINERAL DA UNIÃO. EXCLUSÃO DA MAJORANTE REFERENTE À CONTINUIDADE DELITIVA EM SEDE DE JULGAMENTO DE APELAÇÃO. PLEITO DE RESTABELECIMENTO DA CAUSA DE AUMENTO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL ACERCA DO CARÁTER PERMANENTE OU INSTÂNTANEO DO CRIME SOB EXAME (MODALIDADE USURPAÇÃO POR EXPLORAÇÃO). DELITO QUE ENVOLVE A PRÁTICA DE MÚLTIPLAS CONDUTAS, ALÉM DA EXTRAÇÃO EM SI. CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS QUE INDICAM QUE A CONSUMAÇÃO SE PROLONGOU NO TEMPO. 1. O crime tipificado no art. 2º da Lei n. 8.176/1991, na modalidade de usurpação de matérias-primas pertencentes à União (por exploração), envolve a prática de múltiplas condutas que vão além da extração em si, sendo possível cogitar de prolongamento da consumação mesmo que diante da extração interrompida, mas com manutenção de maquinário e de estrutura visando o transporte, beneficiamento e retomada futura da atividade extrativa em curto prazo. 2. Com efeito, enquanto verificada essa exploração, ou seja, a prática de múltiplas condutas visando a extração do bem mineral, sem evidência de que o agente ativo intencionalmente cessou a atividade extrativa, não há como deixar de reconhecer o caráter permanente do crime. 3. No caso, a moldura fática delineada nas instâncias ordinárias indica que a consumação do crime (exploração) transcorreu por longo período de tempo, notadamente levando em conta a área atingida e os períodos em que a fiscalização se deparou com a atividade ilícita, sem evidência de encerramento da atividade extrativa por iniciativa do réu, circunstância que autoriza a conclusão de que o crime ostenta as características de permanente. 4. Recurso especial improvido. (STJ. REsp 1.998.631-BA, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, SextaTurma, por unanimidade, julgado em 07/06/2022 - Publicado no Informativo nº 740)