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STJ. REsp 1.987.016-RS
Enunciado: O art. 17 da Lei n. 4.595/1964 delimita o conceito de instituições financeiras, mas não veda a prática de mútuo feneratício entre particulares. Na realidade, a importância de definir se o sujeito que efetua o empréstimo de dinheiro, de forma onerosa, é ou não instituição financeira consiste em apurar qual é o regime jurídico aplicável em relação aos juros e a capitalização. Isso porque, as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura, podendo pactuar taxa superior a 12% ao ano (Súmula 596/STF), não se aplicando aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/2002 (REsp 1.061.530/RS, Segunda Seção, DJe 10/3/2009). Ainda, é autorizada a estipulação, desde que expressa no contrato bancário, de capitalização dos juros em periodicidade inferir à anual (Súmula 541/STJ). Trata-se de exceções às instituições financeiras em razão do regime legal aplicável especificamente a elas, de modo que se o empréstimo de dinheiro é concedido por uma pessoa física ou jurídica que não caracteriza instituição financeira, não pode ela gozar de tais exceções, submetendo-se às regras previstas no Código Civil e na Lei de Usura. Em sentido semelhante, REsp 1.720.656/MG, Terceira Turma, DJe 7/5/2020. Portanto, o mútuo celebrado entre particulares, que não integram o sistema financeiro nacional, deve observar as regras constitucionais e de direito civil, mormente o disposto na Lei de Usura, que fixa juros remuneratórios máximos de 12% ao ano (Decreto n. 22.626/1933, art. 1º e §3º) (AgInt no AREsp 1.844.367/SP, Quarta Turma, DJe 1/12/2021). Com efeito, como já reconhecido pela Quarta Turma desta Corte, inegavelmente, em regra, não há proibição legal para empréstimo de dinheiro entre pessoas físicas ou pessoas jurídicas que não componham o sistema financeiro nacional. Há vedação, entretanto, para a cobrança juros, comissões ou descontos percentuais sobre dívidas em dinheiro superiores à taxa permitida por lei, cuja inobservância pode configurar crime nos termos da Lei de Usura (REsp 1.854.818/DF, Quarta Turma, DJe 30/6/2022). Até mesmo quando, no contrato particular de mútuo feneratício for constatada a prática de usura ou agiotagem, a jurisprudência desta Corte entende que deve apenas haver a redução dos juros estipulados para o limite legal, conservando-se o negócio jurídico (REsp 1.106.625/PR, Terceira Turma, DJe 9/9/2011; AgRg no REsp 1.370.532/MG, Terceira Turma, DJe 3/8/2015; AgInt no AREsp 1.486.384/MG, Quarta Turma, DJe 3/12/2019). Ainda, em consulta ao inteiro teor do acórdão proferido no REsp 119.705/RS (Terceira Turma, DJe 29/6/1998) e até das decisões monocráticas, constata-se que a controvérsia não consistia em dizer se o mútuo feneratício era ou não atividade privativa de instituição financeira, mas sim em dizer se as sociedades empresárias de factoring são ou não instituições financeiras, a fim de decidir qual seria o limite da taxa de juros aplicável. Naquela oportunidade, a título de ratio decidendi do julgado, o colegiado decidiu como sendo fora do âmbito das instituições financeiras as empresas de factoring, que, por isso mesmo, não podem aplicar a taxa de juros do mercado financeiro, estando sob o rigor do teto legal de 12% a/a, nos termos do Decreto nº 22.626/33 (REsp 119.705/RS, Terceira Turma, DJe 29/6/1998). Com efeito, esse entendimento é pacífico na jurisprudência desta Corte, conforme os seguintes precedentes: REsp 1.048.341/RS, Quarta Turma, DJe 9/3/2009; REsp 623.691/RS, Quarta Turma, DJ 28/11/2005; REsp 489.658/RS, Quarta Turma, DJ 13/6/2005; REsp 726.975/RJ, Terceira Turma, DJe 6/12/2012; e AgInt nos EDcl no AREsp 40.581/PR, Quarta Turma, DJe 21/9/2018. Dessa maneira, em que pese não seja usual, não é vedado à sociedade empresária de factoring celebrar contrato de mútuo feneratício com outro particular, devendo apenas serem observadas as regras dessa espécie contratual aplicáveis a particulares não integrantes do Sistema Financeiro Nacional, especialmente quanto aos juros devidos e à capitalização. Assim, por exemplo, em hipótese na qual o contrato intitulado como de factoring é descaracterizado para o de mútuo feneratício, o negócio jurídico, em regra, permanece válido, mas deve observar aos arts. 586 a 592 do CC/2002, além das disposições gerais, e eventuais juros devidos não podem ultrapassar a taxa de 12% ao ano, permitida apenas a capitalização anual (arts. 591 e 406 do CC/2002; 1º do Decreto n. 22.626/1933; e 161, § 1º, do CTN), sob pena de redução ao limite legal, conservando-se o negócio.
Tese Firmada: Embora não constitua instituição financeira, não é vedado à sociedade empresária de factoring celebrar contrato de mútuo feneratício, devendo apenas serem respeitadas as regras dessa espécie contratual aplicáveis aos particulares, especialmente quanto aos juros devidos e à capitalização.
Questão Jurídica: Factoring. Natureza jurídica do contrato. Descaracterização para mútuo feneratício pelo tribunal de origem. Empréstimo de dinheiro (mútuo feneratício) entre particulares. Possibilidade. Juros de 12% ao ano e capitalização apenas anual. Art. 591 do CC/2002. Lei da usura. Incidência. Empréstimo concedido por sociedade empresária de factoring que não é instituição financeira. Ausência de nulidade.
Ementa: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO. NATUREZA JURÍDICA DO CONTRATO. FACTORING. DESCARACTERIZAÇÃO PARA MÚTUO FENERATÍCIO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. AUTONOMIA PRIVADA E LIBERDADE DE CONTRATAR. CONTRATO TÍPICO. OBSERVÂNCIA ÀS REGRAS ESPECÍFICAS. EMPRÉSTIMO DE DINHEIRO (MÚTUO FENERATÍCIO) ENTRE PARTICULARES. POSSIBILIDADE. JUROS DE 12% AO ANO E CAPITALIZAÇÃO APENAS ANUAL. ART. 591 DO CC/2002. LEI DA USURA. INCIDÊNCIA. EMPRÉSTIMO CONCEDIDO POR SOCIEDADE EMPRESÁRIA DE FACTORING QUE NÃO É INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. NULIDADE. AUSÊNCIA. ANÁLISE DE EVENTUAL ABUSIVIDADE DA TAXA DE JUROS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE ALEGAÇÃO NAS RAZÕES DO RECURSO ESPECIAL. 1. Ação de embargos à execução, ajuizada em 24/8/2018, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 28/7/2021 e concluso ao gabinete em 10/3/2022. 2. O propósito recursal é decidir se (I) a natureza jurídica do contrato entabulado entre as partes é de factoring ou de mútuo, a fim de avaliar a validade de cláusula que prevê direito de regresso; e (II) a sociedade empresária de fomento mercantil, a despeito de não ser instituição financeira, pode celebrar contrato de mútuo feneratício com outro particular. 3. No direito civil brasileiro, predomina a autonomia privada, de modo que se confere, em regra, total liberdade negocial aos sujeitos da relação obrigacional. Todavia, na hipótese de contratos típicos, além das regras gerais, incidem as disposições legais previstas especificamente para aquela modalidade de contrato, sendo nulas as cláusulas em sentido contrário quando se tratar de direito indisponível. 4. Não há proibição legal para empréstimo de dinheiro (mútuo feneratício) entre particulares (pessoas físicas ou jurídicas não integrantes do Sistema Financeiro Nacional). Nessa hipótese, entretanto, devem ser observados os arts. 586 a 592 do CC/2002, além das disposições gerais, e eventuais juros devidos não podem ultrapassar a taxa de 12% ao ano, permitida apenas a capitalização anual (arts. 591 e 406 do CC/2002; 1º do Decreto nº 22.626/1933; e 161, § 1º, do CTN), sob pena de redução ao limite legal, conservando-se o negócio. Precedentes. 5. Assim, embora não constitua instituição financeira, não é vedado à sociedade empresária de factoring celebrar contrato de mútuo feneratício, devendo apenas serem respeitadas as regras dessa espécie contratual aplicáveis aos particulares. 6. Hipótese em que (I) foi celebrado contrato intitulado como sendo de factoring entre duas pessoas jurídicas, dentre elas uma sociedade empresária de fomento mercantil; (II) o contrato foi descaracterizado pelo Tribunal de origem para o de mútuo feneratício; (III) não há que se falar em invalidade do contrato em razão do empréstimo não ter sido concedido por instituição financeira; (IV) as razões do recurso especial se limitam a discutir a validade do negócio, sem alegar abusividade da taxa de juros e sem indicar dispositivos legais eventualmente violados referentes a esse tema, sendo inviável a sua análise no presente julgamento. 7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. (STJ. REsp 1.987.016-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 06/09/2022, DJe 13/09/2022 - Publicado no Informativo nº 750)