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STJ. HC 739.951-RJ
Enunciado: No caso, os elementos relativos à estabilidade e à permanência, exigidos para a configuração do crime de associação para o tráfico, foram deduzidos da apreensão de significativa quantidade de drogas e de petrechos comuns na prática da narcotraficância, quando da realização de operação na comunidade, além dos depoimentos policiais atestando que seria notória a existência de facção criminosa na localidade e que não seria possível que os acusados estivessem ali sem prévia associação com os demais integrantes da referida facção. Ocorre que não houve investigação prévia ou qualquer elemento de prova capaz de apontar que os acusados estavam associados, de forma estável (sólida) e permanente (duradoura), entre si ou a outrem. Não foi indicada a existência de alvos específicos na citada operação policial nem sequer mencionado o lapso temporal durante o qual os agentes supostamente estavam associados ou quais seriam as suas funções no grupo. Não se pode referendar uma condenação por associação para o tráfico pautada apenas em ilações a respeito do local em que apreendidas as drogas etiquetadas e os petrechos comumente utilizados na endolação de entorpecentes, pois isso equivaleria a validar a adoção de uma seleção criminalizante norteada pelo critério espacial, em que as vilas e favelas são mais frequentemente percebidas como "lugares de tráfico", em razão das representações desses espaços territoriais como necessariamente associados ao comércio varejista de drogas, conforme apontam os crescentes estudos a respeito do espaço como elemento da seletividade penal, especialmente em crimes dessa natureza. Admitir-se que o simples fato de o flagrante ter ocorrido em comunidade dominada por facção criminosa - e não em outros locais da cidade - comprove, ipso facto, a prática do crime em comento significa, em última instância, inverter o ônus probatório e atribuir prova diabólica de fato negativo à defesa, pois exige-se, de certo modo, que o acusado comprove que não está envolvido com facção criminosa. Nessa conjuntura e considerando a jurisprudência desta Corte Superior sobre o tema, conclui-se que foi demonstrada tão somente a configuração do delito de tráfico de drogas, deixando a jurisdição ordinária de descrever objetivamente fatos que demonstrassem o dolo e a existência objetiva de vínculo estável e permanente entre agentes. Por isso, mostra-se indevida a condenação pelo crime de associação para o tráfico de drogas, no qual o sistema acusatório impõe o ônus de que seja declinada a configuração do elemento subjetivo do tipo, com "a demonstração concreta da estabilidade e da permanência da associação criminosa" (HC 462.888/RJ, Rel. Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 05/11/2018).
Tese Firmada: O fato de o flagrante do delito de tráfico de drogas ter ocorrido em comunidade apontada como local dominado por facção criminosa, por si só, não permite presumir que os réus eram associados (de forma estável e permanente) à referida facção, sob pena de se validar a adoção de uma seleção criminalizante norteada pelo critério espacial e de se inverter o ônus probatório, atribuindo prova diabólica de fato negativo à defesa.
Questão Jurídica: Associação para o tráfico de drogas. Estabilidade e permanência. Ausência de comprovação. Flagrante do delito de tráfico em local dominado por facção criminosa. Presunção do vínculo. Inversão do ônus probatório. Descabimento.
Ementa: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. TIPO PENAL DO ART. 35 DA LEI N. 11.343/2006. JURISDIÇÃO LOCAL QUE NÃO DECLINOU OBJETIVA E CONCRETAMENTE A ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA DOS AGENTES PARA A PRÁTICA DA NARCOTRAFICÂNCIA. INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO DURADOURO. INIDONEIDADE DA PRESUNÇÃO DE QUE OS RÉUS ERAM ASSOCIADOS À FACÇÃO QUE COMANDA O TRÁFICO DE DROGAS NA LOCALIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO NÃO COMPROVADO. ÔNUS QUE SE IMPÕE NO SISTEMA ACUSATÓRIO. ABSOLVIÇÃO DE RIGOR. PLEITO DE DECOTE DA MAJORANTE PREJUDICADO. CORRÉU: EXTENSÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO E POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA MINORANTE DO TRÁFICO PRIVILEGIADO COM O CONSEQUENTE REDIMENSIONAMENTO DAS PENAS E A FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL SEMIABERTO. ORDEM CONCEDIDA, INCLUSIVE COM EXTENSÃO DA ORDEM, NO PONTO, AO CORRÉU. 1. No caso, os elementos relativos à estabilidade e à permanência foram deduzidos da apreensão de significativa quantidade de drogas e de petrechos comuns na prática da narcotraficância, quando da realização de operação na localidade, além dos depoimentos policiais atestando que "é notória a existência da facção denominada 'Comando Vermelho (CV)' na Comunidade Nova Holanda" e que "não era possível que os acusados estivessem ali sem prévia associação com os demais traficantes integrantes da referida facção" (fl. 31). 2. Ocorre que, ao que consta, não houve investigação prévia ou qualquer elemento de prova capaz de apontar que os Pacientes estavam associados, de forma estável (sólida) e permanente (duradoura), entre si ou a outrem. Não foi indicada a existência de alvos específicos na citada operação policial nem sequer mencionado o lapso temporal durante o qual os agentes supostamente estavam associados ou quais seriam as suas funções no grupo. 3. Não se pode referendar uma condenação por associação para o tráfico pautada apenas em ilações a respeito do local em que apreendidas as drogas etiquetadas e os petrechos comumente utilizados na endolação de entorpecentes, pois isso equivaleria a validar a adoção de uma seleção criminalizante norteada pelo critério espacial, em que as vilas e favelas são mais frequentemente percebidas como "lugares de tráfico", em razão das representações desses espaços territoriais como necessariamente associados ao comércio varejista de drogas (KONZEN, Lucas P.; GOLDANI, Julia M. "Lugares de tráfico": a geografia jurídica das abordagens policiais em Porto Alegre. Revista Direito GV [online]. 2021, v. 17, n. 3.). Admitir-se que o simples fato de o flagrante ter ocorrido em comunidade dominada por facção criminosa - e não em outros locais da cidade - comprove, ipso facto, a prática do crime em comento significa, em última instância, inverter o ônus probatório e atribuir prova diabólica de fato negativo à Defesa, pois exige-se, de certo modo, que o Acusado comprove que não está envolvido com facção criminosa. 4. Desse modo, de rigor a absolvição dos Pacientes pelo delito de associação para o tráfico. E, uma vez afastada a condenação em tela, fica prejudicado o pedido de decote da majorante prevista no art. 40, inciso IV, da Lei n. 11.343/06, aplicada pelas instâncias ordinárias apenas na dosimetria da pena do crime de associação para o tráfico. 5. O Corréu WALMIR TAVARES DA SILVA, no que diz respeito ao crime de associação para o tráfico, encontra-se na mesma situação fático-processual dos Pacientes, razão pela qual devem ser estendidos a ele os efeitos do julgamento desta impetração, nos termos do art. 580 do Código de Processo Penal. Todavia, diferentemente dos Pacientes, o Corréu é primário e sem antecedentes desabonadores, de forma que faz jus à minorante prevista no art. 33, § 4.º, da Lei n. 11.343/2006, na fração de 1/3 (um terço) - em razão da quantidade e natureza das drogas apreendidas, que não foram valoradas na fixação da pena-base - e ao regime inicial semiaberto. 6. Ordem de habeas corpus concedida para absolver os Pacientes do delito de associação para o tráfico (art. 35 da Lei n. 11.343/2006), mantidos os demais termos dos éditos condenatórios. Determinada a extensão da ordem, no ponto, ao Corréu WALMIR TAVARES DA SILVA e, apenas com relação a ele, redimensionadas também as penas do crime de tráfico de drogas, por força da aplicação da minorante do tráfico privilegiado e fixado o regime inicial semiaberto. (STJ. HC 739.951-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 09/08/2022, DJe 18/08/2022 - Publicado no Informativo nº 753)