STJ. EDcl no REsp 1.567.276-CE

Enunciado: A despeito do entendimento de que "somente após a interpelação do herdeiro sobre a existência de bens sonegados é que a recusa ou omissão configura prova suficiente para autorizar a incidência da pena de sonegados", ainda que a interpelação dos herdeiros não tenha ocorrido, é possível aplicar a pena de perdimento da herança quando comprovados o conhecimento dos herdeiros acerca da ocultação de bens da herança (elemento objetivo), e o dolo (má-fé) existente na conduta de sonegação de bens da herança (elemento subjetivo). No caso, é inconteste ter havido doação inoficiosa do patrimônio amealhado na constância do matrimônio do extinto, em prejuízo do acervo hereditário e em benefício de determinados coerdeiros, sem, contudo, a posterior colação no monte inventariado, com o explícito animus de enriquecimento indevido de uns em detrimento de outros e, ainda, com a simples defesa sustentada no argumento de não se ter de colacionar bens desassociados do nome do de cujus. O patrimônio discutido não constava no nome do falecido, pois as coerdeiras comprovaram que os bens compunham o capital imobilizado dos herdeiros beneficiados - os quais foram adquiridos quando ainda em tenra idade e sem produzirem renda alguma -, em clara antecipação de legítima. A inventariante foi devida e oportunamente interpelada acerca da ocultação de determinados bens, no curso do inventário, quando esta era representante do espólio e de coerdeira - e assistente do coerdeiro relativamente capaz - de modo que todos faziam parte do mesmo processo, assim como eram defendidos pelo mesmo advogado, e, ainda sim, mantiveram a omissão do patrimônio. Posteriormente, já após alcançarem a maioridade, os mesmos coerdeiros tornaram censurável a prática, reiterando a mesma postura sonegadora dos bens adotada quando representados e assistidos pela genitora, ao contestarem a presente ação de sonegados contra si manejada. Com isso, associaram-se ao dolo da inventariante, quando os representara e assistira por ocasião da interpelação, em evidente prejuízo às irmãs unilaterais. Como ressaltado pelo Ministro Luis Felipe Salomão: "configurar-se-á o dolo, revelando-se descabido exigir do herdeiro preterido (ou do credor do espólio) uma prova diabólica - impossível ou excessivamente difícil de ser produzida". Sob essa ótica, é inaceitável impor o refazimento de um ato processual já providenciado há muito tempo, exigindo-se uma nova, pessoal e específica interpelação àquele herdeiro silente e renitente em cumprir um dever que é só dele, pois incumbe a quem foi beneficiado com o adiantamento da legítima trazer o patrimônio ao monte do inventário.

Tese Firmada: É possível aplicar a pena de perdimento da herança aos herdeiros, ainda que estes não tenham sido interpelados pessoalmente, quando comprovados o conhecimento acerca da ocultação de bens da herança e o dolo existente na conduta de sonegação desses bens.

Questão Jurídica: Pena de sonegados. Ausência de interpelação pessoal dos herdeiros. Conhecimento acerca da ocultação de bens da herança. Má-fé. Comprovação. Aplicação. Possibilidade.

Ementa: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO EMBARGADO RECONHECIDA. SUPRIMENTO. DIREITO CIVIL. SUCESSÕES. IMPUGNAÇÃO DE BENS NÃO COLACIONADOS NO INVENTÁRIO. PENA DE SONEGADOS APLICÁVEL AOS COERDEIROS. PERDIMENTO DOS BENS OCULTADOS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, PARA APLICAR A PENALIDADE CIVIL AOS COERDEIROS. 1. Os embargos de declaração têm como objetivo sanar eventual existência de obscuridade, contradição, omissão ou erro material (CPC/2015, art. 1.022). No caso, os presentes aclaratórios merecem acolhimento, para sanar contradição identificada. 2. Nos termos do disposto no artigo 1.780 do Código Civil de 1916 - reproduzido pelo artigo 1.992 do Codex de 2002 -, "o herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando estejam em seu poder, ou, com o seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os deva levar, ou que deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe cabia". 3. Reconhecida a sonegação de bens pelo coerdeiro, incide a penalidade civil de perdimento dos bens sonegados ao coerdeiro favorecido pela liberalidade e que se manteve silente até o encerramento do inventário. 4. Embargos de declaração acolhidos, para sanar a contradição evidenciada no v. acórdão embargado, a fim de conhecer parcialmente do recurso especial interposto pelas ora embargantes, dando-lhe provimento para aplicar a pena de perdimento dos bens sonegados aos coerdeiros embargados. (STJ. EDcl no REsp 1.567.276-CE, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Rel. Acd. Raul Araújo, por maioria, julgado em 22/11/2022 - Publicado no Informativo nº 758)