STJ. REsp 1.722.423-RJ
Enunciado: Cinge-se a controvérsia a determinar se é possível o INSS, pessoa jurídica de direito público, ser vítima de danos morais. Inicialmente, Também não afasta a pretensão reparatória o argumento de que as pessoas que integram o Estado não sofrem "descrédito mercadológico". O direito das pessoas jurídicas à reparação por dano moral não exsurge apenas no caso de prejuízos comerciais, mas também nas hipóteses, mais abrangentes, de ofensa à honra objetiva. Nesse plano, até mesmo entidades sem fins lucrativos podem se atingidas. Assim, não se pode afastar a possibilidade de resposta judicial à agressão perpetrada por agentes do Estado contra a credibilidade institucional da autarquia, a qual implica em dano reflexo sobre os demais segurados da Previdência e os jurisdicionados em geral é evidente, tudo consubstanciado por uma lesão de ordem extrapatrimonial.
Tese Firmada: Pessoa Jurídica de Direito Público tem direito à indenização por danos morais relacionados à violação da honra ou da imagem, quando a credibilidade institucional for fortemente agredida e o dano reflexo sobre os demais jurisdicionados em geral for evidente.
Questão Jurídica: Danos morais. Pessoa Jurídica de Direito Público. Credibilidade institucional agredida. Dano reflexo sobre os demais jurisdicionados. Lesões extrapatrimoniais. Condenação. Possibilidade jurídica.
Ementa: CIVIL E ADMINISTRATIVO. "CASO JORGINA DE FREITAS". LESÕES EXTRAPATRIMONIAIS CAUSADAS POR AGENTES DO ESTADO AO INSS. PREJUÍZOS INSUSCETÍVEIS DE APRECIAÇÃO ECONÔMICA E DE EXTENSÃO INCALCULÁVEL. DANOS EXTRAPATRIMONIAIS. INDENIZAÇÃO. CABIMENTO. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Trata-se, na origem, de demanda proposta pelo INSS com o fim de obter reparação por danos decorrentes de fraude praticada contra a autarquia no contexto do denominado "caso Jorgina de Freitas", cuja totalidade dos prejuízos, segundo as instâncias ordinárias, superou 20 (vinte) milhões de dólares. 2. Consignou-se no acórdão recorrido: "repetindo a sistemática empregada tantas outras vezes, a advogada requereu fossem preparados novos cálculos; o contador os elaborou, alcançando resultado claramente exagerado; o procurador autárquico anuiu prontamente com o mesmo; e o magistrado, em tempo bastante expedito, homologou as contas e determinou a expedição do alvará de levantamento em favor da advogada, fechando-se assim o ciclo - sendo certo que, via de regra, os segurados não chegavam a receber qualquer parcela do montante desviado, que era partilhado entre os membros da organização criminosa" (fl. 2.370, e-STJ). 3. O Tribunal de origem manteve a condenação à reparação dos danos materiais, mas afastou o "pagamento de uma compensação por danos morais, posto que inviável cogitar-se, diante da própria natureza das atividades desempenhadas pelo INSS, de impacto negativo correspondente a descrédito mercadológico" (fl. 2.392, e-STJ). RECONHECIMENTO DE DANO MORAL: DISTINÇÃO PRESENTE NO CASO DOS AUTOS 4. Embora haja no STJ diversas decisões em que se reconheceu a impossibilidade da pessoa jurídica de Direito Público ser vítima de dano moral, o exame dos julgados revela que essa orientação não se aplica ao caso dos autos. 5. Por exemplo, no Recurso Especial 1.258.389/PB, da relatoria do Min. Luis Felipe Salomão, o que estava sob julgamento era ação indenizatória ajuizada por município em razão de programas radiofônicos e televisivos locais que faziam críticas ao Poder Executivo. No Recurso Especial 1.505.923/PR, Relator Min. Herman Benjamin, a pretensão indenizatória se voltava contra afirmações de que autarquia federal teria produzido cartilha com informações inverídicas. No Recurso Especial 1.653.783/SP, Relator Min. Mauro Cambpell, discutiu-se o uso indevido de logotipo do Ibama. 6. Diversamente do que se verifica no caso dos autos, nesses precedentes estava em jogo a livre manifestação do pensamento, a liberdade de crítica dos cidadãos ou o uso indevido de bem imaterial do ente público. DANOS EXTRAPATRIMONIAIS 7. Também não afasta a pretensão reparatória o argumento de que as pessoas que integram o Estado não sofrem "descrédito mercadológico". 8. O direito das pessoas jurídicas à reparação por dano moral não exsurge apenas no caso de prejuízos comerciais, mas também nas hipóteses, mais abrangentes, de ofensa à honra objetiva. Nesse plano, até mesmo entidades sem fins lucrativos podem se atingidas. 9. Transcreve-se no acórdão recorrido trecho da condenação criminal, relativa aos mesmos fatos, em que o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro afirmou: "além do descrédito da Justiça, as conseqüências concretas dos delitos, representadas pelas perdas patrimoniais, foram extremamente graves. Somente pelas cifras apuradas nestes autos evidencia-se o colossal prejuízo causado ao erário, que será impossível reparar cabalmente, a despeito das medidas assecuratórias adotadas" (fl. 2.366, e-STJ). 10. Não se pode afastar a possibilidade de resposta judicial à agressão perpetrada por agentes do Estado contra a credibilidade institucional da autarquia. VOTO VOGAL DO MIN. OG FERNANDES 11. Quanto à imposição de condenação na instância superior, devem ser acolhidas as bem lançadas razões apresentadas pelo eminente Min. Og Fernandes. 12. Considerando que "o acórdão recorrido limitou-se a reconhecer a impossibilidade jurídica do pedido de indenização por danos morais", afirmou Sua Excelência que "o provimento jurisdicional a ser exarado na instância extraordinária deve apenas afastar tal premissa, não sendo possível reconhecer, desde logo, a procedência do pleito indenizatório". CONCLUSÃO 13. Recurso Especial provido, com determinação de retorno dos autos, para que, tendo como fixada a viabilidade jurídica da reparação por danos morais, o Tribunal de origem reaprecie a questão como entender de direito. (STJ. REsp 1.722.423-RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 24/11/2020, DJe 18/12/2020 - Publicado no Informativo nº 684)