STJ. HC 478.310/PA

Enunciado: Discute-se a possibilidade de não tipificação do estupro de vulnerável em virtude da ausência de contato físico entre o agente e as vítimas. No caso, as instâncias de origem delinearam e reconheceram a ocorrência de todos os elementos contidos no art. 217-A do Código Penal, com destaque à qualidade de partícipe do réu, diante da autoria intelectual dos delitos, bem como da prescindibilidade de contato físico direto para a configuração dos crimes. Sobre o tema, frisa-se que é pacífica a compreensão de que o estupro de vulnerável se consuma com a prática de qualquer ato de libidinagem ofensivo à dignidade sexual da vítima, conforme já consolidado por este Superior Tribunal de Justiça. Doutrina e jurisprudência sustentam a prescindibilidade do contato físico direto do réu com a vítima, a fim de priorizar o nexo causal entre o ato praticado pelo acusado, destinado à satisfação da sua lascívia, e o efetivo dano à dignidade sexual sofrido pela ofendida. Ressalta-se que os precedentes desta Corte já delinearam a chamada contemplação lasciva como suficiente para a configuração de ato libidinoso, elemento indispensável constitutivo do delito do art. 217-A do Código Penal. A ênfase recai no eventual transtorno psíquico que a conduta praticada enseja na vítima e na real ofensa à sua dignidade sexual, o que torna despicienda efetiva lesão corporal física por força de ato direto do agente. Nesse sentido: HC 611.511/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma., DJe 15/10/2020 e RHC n. 70.976/MS, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, 5ª Turma, DJe 10/08/2016. Em reforço, lembra-se que, em se tratando de vítima menor de 14 anos, a proteção integral à criança e ao adolescente, em especial no que se refere às agressões sexuais, é preocupação constante de nosso Estado (art. 227, caput, c/c o § 4º, da Constituição da República) e de instrumentos internacionais (art. 34, "b", da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aprovada pela Resolução n. 44/25 da ONU, em 20/11/1989, e internalizada no ordenamento jurídico nacional, mediante o Decreto Legislativo n. 28/1990). Na situação em exame, ficou devidamente comprovado que o acusado agiu mediante nítido poder de controle psicológico sobre as outras duas agentes, dado o vínculo afetivo entre eles estabelecido. Assim, as incitou à prática dos atos de estupro contra as infantes (ambas menores de 14 anos), com o envio das respectivas imagens via aplicativo virtual, as quais permitiram a referida contemplação lasciva e a consequente adequação da conduta ao tipo do art. 217-A do Código Penal. Por fim, cumpre registrar que esta Corte Superior também reconhece a prática do delito de estupro no qual o agente concorre na qualidade de partícipe, tese que se coaduna com parte da fundamentação lançada pelo Juízo de origem e que, igualmente, se amolda ao caso dos autos. Nessa linha: RHC 110.301/PR, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, 5ª Turma, DJe 11/06/2019.

Tese Firmada: O mentor intelectual dos atos libidinosos responde pelo crime de estupro de vulnerável.

Questão Jurídica: Estupro de vulnerável. Contato físico direto. Prescindibilidade. Qualquer ato de libidinagem. Contemplação lasciva por meio virtual. Suficiência.

Ementa: HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. QUALQUER ATO DE LIBIDINAGEM. CONTATO FÍSICO DIRETO. PRESCINDIBILIDADE. CONTEMPLAÇÃO LASCIVA POR MEIO VIRTUAL. SUFICIÊNCIA. ORDEM DENEGADA. 1. É pacífica a compreensão, portanto, de que o estupro de vulnerável se consuma com a prática de qualquer ato de libidinagem ofensivo à dignidade sexual da vítima, conforme já consolidado por esta Corte Nacional. 2. Doutrina e jurisprudência sustentam a prescindibilidade do contato físico direto do réu com a vítima, a fim de priorizar o nexo causal entre o ato praticado pelo acusado, destinado à satisfação da sua lascívia, e o efetivo dano à dignidade sexual sofrido pela ofendida. 3. No caso, ficou devidamente comprovado que o paciente agiu mediante nítido poder de controle psicológico sobre as outras duas agentes, dado o vínculo afetivo entre eles estabelecido. Assim, as incitou à prática dos atos de estupro contra as infantes (uma de 3 meses de idade e outra de 2 anos e 11 meses de idade), com o envio das respectivas imagens via aplicativo virtual, as quais permitiram a referida contemplação lasciva e a consequente adequação da conduta ao tipo do art. 217-A do Código Penal. 4. Ordem denegada. (STJ. HC 478.310/PA, Rel. Min. Rogério Schietti, Sexta Turma, por unanimidade, 09/02/2021 - Publicado no Informativo nº 685)