STJ. CC 164.709/MG

Enunciado: A participação de trabalhadores ativos e aposentados no conselho de administração de sociedades anônimas ou na gestão de qualquer sociedade empresária é garantida na parte final do inciso XI do art. 7º da Constituição da República como direito excepcional dos trabalhadores. Sendo um direito trabalhista extraordinário, não poderá a lei que venha a instituí-lo e regulamentá-lo, concretizando a previsão constitucional, impô-lo como regra; terá, ao invés, de estabelecê-lo como exceção. Então, ao ser instituído por lei aquele direito excepcional em favor dos trabalhadores, seu exercício se dará conforme ali disciplinado, observadas as restrições decorrentes da previsão constitucional. Atenta a esses condicionantes e à ausência de lei especial regulamentadora da previsão constitucional é que a jurisprudência da Segunda Seção entende que a definição da competência em hipóteses assemelhadas fica a depender do contexto das demandas consideradas, ante a natureza especializada da Justiça Trabalhista. Na hipótese, não trata propriamente da discussão do direito trabalhista estrito senso, ou seja, de controvérsias decorrentes da relação de trabalho ou de representação sindical, ou mesmo de "outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho". A causa de pedir das ações originárias gravita em torno de relação de natureza estatutária, civil e empresarial. Como se sabe, o Conselho de Administração das Companhias, como órgão de deliberação colegiada, é regulado pelo direito empresarial, na Lei das Sociedades Anônimas (Lei n. 6.404/1976), enquanto o direito facultativo e excepcional de participação dos empregados no aludido conselho tem expressa previsão no parágrafo único do art. 140 da Lei das S/A. A legislação de Direito Empresarial, a Lei das S/A, rege a vida das companhias que disputam o mercado, especialmente das chamadas companhias abertas que angariam recursos no mercado de ações, de modo a cumprirem requisitos de governança e transparência para enfrentar adequadamente a acirrada concorrência no mercado nacional e internacional, no qual atuem. A referida lei ao estabelecer, em seu art. 139, parágrafo único, que o estatuto poderá prever a participação dos empregados no conselho de administração, faculta às companhias ensejar esse direito excepcional aos trabalhadores, mediante previsão nos respectivos estatutos, por ato de liberalidade dessas empresas. Assim, a criação desse direito trabalhista, de índole não obrigatória e extraordinária, não pode ser imposta às sociedades anônimas. Fica a depender destas a concepção do benefício no âmbito de cada sociedade empresária. Uma vez criado o direito pelo respectivo estatuto social, os representantes dos empregados deverão ser escolhidos pelo voto destes, em eleição direta, organizada pela própria companhia, em conjunto com as entidades sindicais representativa da categoria.

Tese Firmada: Compete à Justiça Comum julgar a participação de trabalhadores ativos e aposentados no conselho de administração de sociedades anônimas.

Questão Jurídica: Sociedade anônima. Conselho de Administração. Eleição. Participação de trabalhadores ativos e aposentados. Direito facultativo e excepcional do trabalhador. Competência da Justiça Comum.

Ementa: CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA DO TRABALHO E JUSTIÇA COMUM ESTADUAL. AÇÃO ORDINÁRIA AJUIZADA PERANTE A JUSTIÇA ESTADUAL E AÇÃO CIVIL PÚBLICA, DE MAIOR ABRANGÊNCIA, PROPOSTA NA JUSTIÇA TRABALHISTA. SOCIEDADE ANÔNIMA. PREVISÃO ESTATUTÁRIA E ELEIÇÃO DE REPRESENTANTE DE EMPREGADOS ATIVOS, INATIVOS E PENSIONISTAS PARA O CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO. PRETENSÃO DE QUESTIONAMENTO E ANULAÇÃO DA ELEIÇÃO EM AMBAS AS AÇÕES. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL, NO PONTO. CONFLITO PARCIALMENTE CONHECIDO. 1. Conhece-se parcialmente do conflito para definir a competência a fim de conhecer e julgar ações tratando de anulação de assembleia de eleição de representante dos trabalhadores ativos, inativos e pensionistas para o conselho de administração de sociedade anônima. 2. Como direito excepcional dos trabalhadores, a participação destes na gestão da empresa não é assegurada de forma geral e obrigatória (norma autoexecutória) na legislação trabalhista ordinária, consolidada ou não, pois depende de regulamentação por lei especial, típica das normas programáticas. 3. Sendo um direito trabalhista extraordinário, não poderá a lei que venha a instituí-lo e regulamentá-lo impô-lo como regra; terá, ao invés, de estabelecê-lo como exceção, em observância à previsão constitucional. 4. Atenta a essas condicionantes e à ausência de lei especial regulamentadora do direito, a jurisprudência da Segunda Seção entende que a definição da competência em hipóteses assemelhadas fica a depender do contexto das demandas consideradas, ante a natureza especializada da Justiça Trabalhista. 5. O conselho de administração das companhias, órgão de deliberação colegiada, é regulado pelo direito empresarial, na Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/76), estando o direito facultativo e excepcional de participação dos empregados no aludido conselho expressamente previsto no atual § 1º do art. 140 da Lei das S/A (antigo parágrafo único do art. 140). 6. A legislação de direito empresarial, a Lei das S/A, rege a vida das companhias que disputam o mercado, especialmente das chamadas companhias abertas que angariam recursos no mercado primário e secundário de ações, de modo a cumprirem requisitos de governança e transparência para enfrentarem adequadamente a acirrada concorrência nos mercados nacional e internacional, nos quais atuem. 7. Assim, a criação desse direito trabalhista, de índole não obrigatória e extraordinária, não pode ser imposta às sociedades anônimas. Fica a depender destas a concepção do benefício no âmbito de cada sociedade empresária. Uma vez instituído o direito pelo respectivo estatuto social, os representantes dos empregados deverão ser escolhidos pelo voto destes, em eleição direta, organizada pela própria companhia, em conjunto com as entidades sindicais representativas da categoria. 8. Naturalmente, a decisão sobre a correção na instituição do direito em cada caso concreto caberá ao Judiciário, ao ser provocado. Em sede de conflito de competência, caberá apenas definir o órgão judicial competente para processar e julgar as ações. 9. A relação jurídica em evidência não deriva imediatamente da relação de trabalho (CF, art. 114, I) ou de outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (CF, art. 114, IX) ou, ainda, de litígio acerca de representação sindical, entre sindicatos e trabalhadores (CF, art. 114, III), pois decorre diretamente de previsão estatutária da companhia, com supedâneo em norma de direito empresarial. 10. Conflito de competência parcialmente conhecido para, na parte conhecida, declarar a competência da Justiça Comum Estadual, no caso, da 5ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte-MG, nos termos da Súmula 170/STJ. (STJ. CC 164.709/MG, Rel. p/ acórdão Min. Raul Araújo, Segunda Seção, por maioria, julgado em 28/04/2021. - Publicado no Informativo nº 694)