STJ. REsp 1.825.555-MT

Enunciado: A Constituição Federal de 1988 dispõe, dentre os princípios da atividade econômica, o "tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País" (IX), em que deverão receber tratamento jurídico diferenciado, visando o incentivo na simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou na eliminação ou redução destas por meio de lei, nos termos do art. 179. Nesse contexto, o escopo protetivo da norma foi posteriormente encampado pela Lei n. 11.101/2005 (LREF), que, dentre vários dispositivos, estabeleceu, especificamente, na Seção V do Capítulo III, um microssistema próprio para tais empresas de pequeno porte, conferindo prerrogativa na adoção de regime facultativo. Nos termos do art. 70, § 1º, a microempresa poderá optar entre o plano especial de recuperação judicial dos arts. 70 a 72 ou seguir pelo rito comum dos arts. 51 e seguintes. A questão ora em julgamento é justamente saber se a regra do § 5º do art. 24 da LREF - que limita a remuneração do administrador judicial em 2% - está atrelada à opção da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte pelo rito especial de recuperação (LREF, arts. 70-72), procedimento judicial mais simplificado, ou seja, trata-se de definir se a regra limitadora da retribuição ocorre em razão da qualificação da pessoa - ME e EPP -, ou em razão da escolha pelo procedimento do plano especial de recuperação judicial. Seguindo os ditames constitucionais, a regra teve o escopo de proteger eminentemente a pessoa do devedor que se enquadra nos requisitos legais da empresa de pequeno porte, dando o devido tratamento favorecido, independentemente da sua opção pela adoção do plano especial de recuperação. Ademais, quando o legislador quis, realmente, restringir determinada regra - somente para aqueles que optaram pelo rito específico dos arts. 70 a 72 da LREF -, ele o fez expressamente. Somado a isso, no âmbito do sistema recuperacional, existem diversos dispositivos espalhados de forma sistemática em prol da reabilitação das microempresas, não se limitando o tratamento diferenciado às disposições da seção atinente ao plano especial. Por outro lado, entender de forma diversa acabaria por privar a empresa de pequeno porte de todas as outras benesses previstas em Lei, apenas pelo fato de que, estrategicamente, optou por não adotar o plano especial.

Tese Firmada: A remuneração do administrador judicial nas recuperações judiciais envolvendo Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, com limitação de 2% do valor dos créditos submetidos à recuperação ou dos bens alienados na falência (LREF, art. 24, § 5º), aplica-se às recuperações judiciais em que haja a opção pelo plano especial (LREF, arts. 70 a 72) e, também, àquelas que adotem o procedimento ordinário de recuperação judicial (LREF, arts. 51 e seguintes).

Questão Jurídica: Recuperação judicial. Microempresas e Empresas de Pequeno Porte. Administrador judicial. Remuneração. Limitação de 2%. Rito especial e procedimento ordinário. Aplicabilidade.

Ementa: RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. MICRO EMPRESA E EMPRESA DE PEQUENO PORTE. REMUNERAÇÃO DO ADMINISTRADOR JUDICIAL. INCIDÊNCIA DO ART. 24, § 5º, DA LEI N. 11.101/2005 INDEPENDENTEMENTE DA OPÇÃO PELA ADOÇÃO DO PLANO ESPECIAL DE RECUPERAÇÃO, PREVISTOS NOS ARTS. 70-72 DA LREF. A PROTEÇÃO NORMATIVA SE DÁ EM RAZÃO DA PESSOA DO DEVEDOR E NÃO DO RITO PROCEDIMENTAL ESCOLHIDO. 1. A remuneração do administrador judicial, valor e forma de pagamento, deverá ser fixada pelo magistrado, tendo-se como norte a capacidade de pagamento do devedor, o grau de complexidade do trabalho e os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes, "em qualquer hipótese, o total pago ao administrador judicial não excederá 5% (cinco por cento) do valor devido aos credores submetidos à recuperação judicial ou do valor de venda dos bens na falência" ficando a remuneração "reduzida ao limite de 2% (dois por cento), no caso de microempresas e de empresas de pequeno porte" (LREF, art. 24, §§ 1º e 5º). 2. A regra de limitação remuneratória teve o escopo de proteger eminentemente a pessoa jurídica que se enquadra nos requisitos legais da microempresa e da empresa de pequeno porte, ante o objetivo visado pelo legislador de proporcionar-lhes um tratamento favorecido, conforme comando do texto constitucional. 3. A remuneração do administrador judicial é categoria jurídica específica dotada de conteúdo normativo próprio e, por conseguinte, a eventual escolha do devedor pelo plano especial de recuperação judicial (LFRE, arts. 70-72), não pode ser tida como critério determinante a afastar a limitação de 2% imposta pela lei. 4. Recurso especial não provido. (STJ. REsp 1.825.555-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 04/05/2021. - Publicado no Informativo nº 695)