STJ. REsp 1.418.771-DF

Enunciado: Inicialmente, a associação, representando os participantes e assistidos de plano de benefícios de previdência complementar administrado pela GEAP, ajuizou previamente ação coletiva vindicando a restituição de valores vertidos a título de pecúlio, tendo sido o pedido acolhido pelas instâncias ordinárias - decisão transitada em julgada. Conforme apurado pela Corte local, na fase de liquidação, "diante da dificuldade e da complexidade de efetuarem-se os cálculos, relativos à liquidação do julgado (quantum debeatur), as próprias partes, de comum acordo, transigiram, de forma a advir o 'termo de acordo e quitação mútua', homologado pelo ilustre juiz da Nona Vara Cível da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília". Quanto ao mérito do recurso, parece mesmo incorreta a invocação, pela Corte local, da coisa julgada material, pois sentença que se limita a homologar transação constitui mero juízo de delibação, nem sequer sendo, pois, sujeita à impugnação em ação rescisória. De todo modo, isso não tem o condão de alterar o decidido, pois, malgrado não se possa falar em coisa julgada material, segundo a doutrina "o ato jurídico perfeito e a coisa julgada podem ser reconduzidos ao conceito de direito adquirido, que abrange os outros dois institutos". Está presente o ato jurídico perfeito, consubstanciado em contrato de transação firmado entre as partes (legitimado, reconhecido pela lei como idôneo para defesa dos interesses individuais dos associados), com expressa e incontroversa cláusula de quitação geral. Nessa linha de intelecção, é de todo oportuno salientar que a associação ajuizou uma nova ação condenatória referente à restituição de pecúlio, malgrado apenas mediante ação anulatória, embasada no artigo 486 do CPC/1973 (diploma aplicável ao caso), é que se poderia cogitar a desconstituição do acordo homologado por sentença. Vale conferir a redação: "[O]s atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil". É que o art. 966, § 4º, do CPC/2015 também dispõe que os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei. Por fim, a Segunda Seção, em decisão unânime, perfilhou o entendimento de que, em havendo transação, o exame do juiz deve se limitar à sua validade e eficácia, verificando se houve efetiva transação, se a matéria comporta disposição, se os transatores são titulares do direito do qual dispõem parcialmente, se são capazes de transigir - não podendo, sem que se proceda a esse exame, ser simplesmente desconsiderada a avença (AgRg no AREsp 504.022/SC, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 10/09/2014, DJe 30/09/2014).

Tese Firmada: Não há que se falar em coisa julgada material contra transação homologada em juízo pactuada entre a associação e entidade previdenciária para liquidação de sentença coletiva.

Questão Jurídica: Liquidação de sentença coletiva. Transação homologada em juízo. Coisa julgada material. Inocorrência.

Ementa: RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RATIFICAÇÃO DE APELAÇÃO INTERPOSTA ANTES DA REJEIÇÃO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DESNECESSIDADE. TRANSAÇÃO PARA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA COLETIVA. LEGITIMIDADE DA ASSOCIAÇÃO PARA PACTUAÇÃO DA AVENÇA. EXISTÊNCIA. HOMOLOGAÇÃO. JUÍZO DE DELIBAÇÃO. COISA JULGADA. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE VÍCIOS NO NEGÓCIO JURÍDICO. ATO JURÍDICO PERFEITO. CLÁUSULA GERAL DE QUITAÇÃO. VINDICAÇÃO DE VERBA SUPLEMENTAR EM AÇÃO CONDENATÓRIA. INADMISSIBILIDADE DA VIA PROCESSUAL ELEITA E VIOLAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA. CONSTATAÇÃO. 1. Os embargos de declaração opostos por outra parte litigante em face da sentença foram rejeitados. Com efeito, a Corte Especial cancelou a Súmula n. 418/STJ, na Questão de Ordem no REsp n. 1.129.215/DF, perfilhando o entendimento de que só há falar em ratificação do recurso anteriormente interposto na hipótese de alteração da decisão recorrida em razão do acolhimento dos embargos de declaração. 2. A associação, representando os participantes e assistidos de plano de benefícios de previdência complementar administrado pela entidade previdenciária ré, ajuizou previamente ação coletiva vindicando verba relacionada a pecúlio, tendo sido o pedido acolhido pelas instâncias ordinárias - decisão transitada em julgada. Conforme apurado pela Corte local, na fase de liquidação, as partes, de comum acordo, pactuaram transação que continha cláusula conferindo quitação geral, homologada em Juízo. 3. É "necessário romper com a ideia de que todas as lides devem passar pela chancela do Poder Judiciário, ainda que solucionadas extrajudicialmente. Deve-se valorizar a eficácia dos documentos produzidos pelas partes, fortalecendo-se a negociação, sem que seja necessário, sempre e para tudo, uma chancela judicial. A evolução geral do direito, num panorama mundial, caminha nesse sentido" (REsp 1.184.151/MS, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, julgado em 15/12/2011, DJe 09/2/2012). 4. Malgrado não se possa falar em coisa julgada material, o ato jurídico perfeito integra o conceito de direito adquirido, que abrange esses dois institutos. Nada obstante, tendo a Associação recorrente ajuizado uma nova ação condenatória também referente à restituição de pecúlio, ainda que apenas mediante ação anulatória, observando-se o prazo decadencial, só então é que se poderia cogitar a desconstituição do acordo homologado por sentença, sendo certo que a transação é caracterizada pelo consenso e pela reciprocidade de concessões - em outros termos, a pactuação gera novação. 5. A Segunda Seção, por ocasião do julgamento do AgRg no AREsp n. 504.022/SC, afetado pela Quarta Turma àquele Colegiado para pacificação da matéria, perfilhou o entendimento de que, em havendo transação, o exame do juiz deve limitar-se à sua validade e eficácia, verificando se houve efetiva transação, se a matéria comporta disposição, se os transatores são titulares do direito do qual dispõem parcialmente, se são capazes de transigir - não podendo, sem que se proceda a esse exame, ser simplesmente desconsiderada a avença (AgRg no AREsp n. 504.022/SC, rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Segunda Seção, julgado em 10/9/2014, DJe 30/9/2014). 6. Por um lado, o comportamento da parte autora é manifestamente contraditório e incompatível com a tutela da confiança, pois pactua transação, conferindo expressa quitação geral e, em seguida, de modo oposto ao primeiro comportamento, ajuíza ação condenatória incompatível com o acordado. Por outro lado, a segurança das relações jurídicas depende da lealdade, da equivalência das prestações e contraprestações, da confiança recíproca, da efetividade dos negócios jurídicos, da coerência e clarividência dos direitos e deveres. 7. Recurso especial desprovido. (STJ. REsp 1.418.771-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 03/08/2021. - Publicado no Informativo nº 703)