STJ. REsp 1.947.749-SP

Enunciado: A teor do § 2º do art. 1.639 do CC/2002, para a modificação do regime de bens, basta que ambos os cônjuges deduzam pedido motivado, cujas razões devem ter sua procedência apurada em juízo, sem prejuízo dos direitos de terceiros, resguardando-se os efeitos do ato jurídico perfeito do regime originário, expressamente ressalvados pelos arts. 2.035 e 2.039 do Código Civil. O poder atribuído aos cônjuges pelo § 2º do art. 1.639 do CC/2002 de modificar o regime de bens do casamento subsiste ainda que o matrimônio tenha sido celebrado na vigência do Código Civil de 1916. A melhor interpretação que se pode conferir ao referido dispositivo é aquela segundo a qual não se deve "exigir dos cônjuges justificativas exageradas ou provas concretas do prejuízo na manutenção do regime de bens originário, sob pena de se esquadrinhar indevidamente a própria intimidade e a vida privada dos consortes" (REsp 1.119.462/MG, Quarta Turma, julgado em 26/02/2013, DJe 12/03/2013). Em situações em que o exame dos autos não revela aos juízos de primeiro e segundo graus - soberanos na apreciação das provas - qualquer elemento concreto capaz de ensejar o reconhecimento, ainda que de forma indiciária, de eventuais danos a serem suportados por algum dos consortes ou por terceiros, há de ser preservada a vontade dos cônjuges, sob pena de violação de sua intimidade e vida privada. Assim, ante a previsão legal e a presunção de boa-fé que favorece os autores, desde que resguardado direitos de terceiros, a cessação da incapacidade de um dos cônjuges - que impunha a adoção do regime da separação obrigatória de bens sob a égide do Código Civil de 1916 - autoriza, na vigência do CC/2002, em prestígio ao princípio da autonomia privada, a modificação do regime de bens do casamento.

Tese Firmada: A cessação da incapacidade civil de um dos cônjuges, que impunha a adoção do regime da separação obrigatória de bens sob a égide do Código Civil de 1916, autoriza a modificação do regime de bens do casamento.

Questão Jurídica: Casamento celebrado sob a égide do CC/1916. Incapacidade de um dos cônjuges. Cessação. Modificação do regime de bens. Possibilidade.

Ementa: RECURSO ESPECIAL. CIVIL. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. AUSÊNCIA. CASAMENTO CELEBRADO SOB A VIGÊNCIA DO CC/1916. ADVENTO DO CC/2002. POSSIBILIDADE DE MODIFICAÇÃO DO REGIME DE BENS. CESSAÇÃO DA INCAPACIDADE DE UM DOS CÔNJUGES. MOTIVAÇÃO SUFICIENTE. 1- Recurso especial interposto em 26/6/2020 e concluso ao gabinete em 2/7/2021. 2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) o acórdão recorrido estaria deficientemente fundamentado; e b) a cessação da incapacidade civil de um dos cônjuges, que impunha a adoção do regime da separação obrigatória de bens sob a égide do Código Civil de 1916, autoriza, em prestígio ao princípio da autonomia privada e na vigência do Código Civil de 2002, a modificação do regime de bens do casamento. 3- Devidamente analisada e discutida a questão de mérito e fundamentado suficientemente o acórdão recorrido naquilo que o Tribunal considerou pertinente ao deslinde da controvérsia, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há que se falar em violação do art. 489 do CPC/15. 4- A teor do § 2º do art. 1.639 do CC/2002, para a modificação do regime de bens, basta que ambos os cônjuges deduzam pedido motivado, cujas razões devem ter sua procedência apurada em juízo, sem prejuízo dos direitos de terceiros, resguardando-se os efeitos do ato jurídico perfeito do regime originário, expressamente ressalvados pelos arts. 2.035 e 2.039 do Código atual. 5- O poder atribuído aos cônjuges pelo § 2º do art. 1.639 do CC/2002 de modificar o regime de bens do casamento subsiste ainda que o matrimônio tenha sido celebrado na vigência do Código Civil de 1916. 6- A melhor interpretação que se pode conferir ao § 2º do art. 1.639 do CC é aquela segundo a qual não se deve "exigir dos cônjuges justificativas exageradas ou provas concretas do prejuízo na manutenção do regime de bens originário, sob pena de se esquadrinhar indevidamente a própria intimidade e a vida privada dos consortes" (REsp 1119462/MG, QUARTA TURMA, julgado em 26/02/2013, DJe 12/03/2013). 7- Em situações como a presente, em que o exame dos autos não revelou aos juízos de primeiro e segundo graus - soberanos na apreciação das provas - qualquer elemento concreto capaz de ensejar o reconhecimento, ainda que de forma indiciária, de eventuais danos a serem suportados por algum dos consortes ou por terceiros, há de ser preservada a vontade dos cônjuges, sob pena de violação de sua intimidade e vida privada. 8- Ante a previsão do art. 1.639, § 2º, do CC/2002 e a presunção de boa-fé que favorece os autores, desde que resguardado direitos de terceiros, a cessação da incapacidade de um dos cônjuges - que impunha a adoção do regime da separação obrigatória de bens sob a égide do Código Civil de 1916 - autoriza, na vigência do CC/2002, em prestígio ao princípio da autonomia privada, a modificação do regime de bens do casamento. 9- Os efeitos da modificação do regime de bens do casamento operam ex nunc, isto é, a partir da decisão que homologa a alteração, ficando regidos os fatos jurídicos anteriores e os efeitos pretéritos pelo regime de bens então vigente. Precedentes. 10- Recurso especial provido. (STJ. REsp 1.947.749-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 14/09/2021, DJe 16/09/2021. - Publicado no Informativo nº 709)