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STJ. REsp 1.878.051-SP
Enunciado: Cinge-se a controvérsia a definir se, no âmbito de execução ajuizada em face da Confederação Brasileira de Tênis de Mesa (CBTM), podem ser penhorados os recursos públicos recebidos pela devedora (instituição privada sem fins lucrativos) e destinados para aplicação exclusiva e integral em programas e em projetos de fomento do desporto nacional. Recentemente, a Quarta Turma, ao apreciar o Recurso Especial 1.691.882/SP, tratou da hipótese de mitigação da tutela executiva, apontando o intuito do legislador (em juízo ex ante de ponderação e numa perspectiva de sociabilidade) de prestigiar os recursos públicos com desígnios sociais e, por conseguinte, salvaguardar o direito coletivo de sujeitos indeterminados favorecidos pelos investimentos nas áreas de educação, saúde ou assistência social. De acordo com a doutrina, o inciso IX do artigo 833 do CPC de 2015 - que reproduziu o inciso IX do artigo 649 do CPC de 1973 - contempla hipótese de impenhorabilidade absoluta fundada no interesse público, que exibe elevado espírito social e se harmoniza com os princípios político-constitucionais contidos no artigo 1º da Carta Magna de 1988, os quais retratam os fundamentos do Estado brasileiro. No entanto, o dinheiro originariamente público - mas objeto de repasse - integra o patrimônio das pessoas jurídicas de direito privado, assim a necessidade da definição da "origem" e da "finalidade" dos recursos para a incidência da regra de impenhorabilidade. Assim, a doutrina ensina que a impenhorabilidade das verbas públicas - recebidas por pessoas jurídicas de direito privado, com destinação compulsória a finalidades específicas albergadas pela Constituição - caracteriza, "no plano técnico-processual, uma projeção da intangibilidade dos recursos do próprio ente de direito público que os transfere a tais instituições". Nessa ordem de ideias, as verbas públicas objeto de repasse para instituições privadas - com destinação especial atrelada à satisfação de tarefas públicas -, em razão dessa natureza, não se acham entregues à livre disposição da vontade de quem as possui e as administra, sobressaindo, inclusive, o dever de prestação de contas previsto no parágrafo único do artigo 70 da Constituição Federal. Tal inferência não significa, decerto, uma blindagem de todo o patrimônio da pessoa jurídica de direito privado que receba verbas públicas atreladas compulsoriamente a uma destinação de cunho social. Isso porque os recursos públicos obtidos para fins de remuneração ou de contraprestação por serviços prestados, assim como os bens e os recursos privados (mesmo quando voltados a um desígnio social), continuarão sendo objeto de possível excussão forçada, por integrarem o patrimônio disponível da devedora obrigada. Postas tais premissas, é certo que, para além do princípio da supremacia do interesse público, o dinheiro repassado pelos entes estatais - para aplicação exclusiva e compulsória em finalidade de interesse social - não chega sequer a ingressar na "esfera de disponibilidade" da instituição privada, o que constitui fundamento apto a justificar a sua impenhorabilidade não apenas por força do disposto no inciso IX do artigo 833 do CPC (que remete, expressamente, às áreas de educação, saúde e assistência social), mas também em virtude do princípio da responsabilidade patrimonial enunciado nos artigos 789 e 790 do mesmo diploma. No caso, a natureza eminentemente pública das verbas - dadas a sua afetação a uma finalidade social específica estampada nos planos de trabalho a serem obrigatoriamente seguidos pela CBTM e a previsão dos deveres de prestação de contas e de restituição do saldo remanescente - torna evidente o fato de que a instituição privada não detém a disponibilidade das referidas quantias, as quais, por conseguinte, não se incorporam ao seu patrimônio jurídico para fins de subordinação ao processo executivo.
Tese Firmada: São impenhoráveis os recursos públicos recebidos por instituições privadas destinados exclusivamente ao fomento de atividades desportivas.
Questão Jurídica: Execução de título extrajudicial contra a Confederação Brasileira de Tênis de Mesa (CBTM). Fomento de atividades desportivas. Repasses de recursos públicos. Afetação. Finalidade social. Impenhorabilidade.
Ementa: RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL AJUIZADA EM FACE DA CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE TÊNIS DE MESA (CBTM). REPASSES DE RECURSOS PÚBLICOS DESTINADOS AO FOMENTO DE ATIVIDADES DESPORTIVAS. IMPENHORABILIDADE. 1. Nos termos dos artigos 789 e 790 do CPC de 2015, depreende-se que, em regra, somente os bens integrantes do patrimônio do devedor - a um só tempo obrigado e responsável - estão sujeitos à excussão destinada a obter soma em dinheiro apta ao adimplemento da prestação (pecuniária ou de dar coisa) encartada em título judicial ou extrajudicial. 2. Nada obstante, como bem destaca a parte final do artigo 789, nem todos os bens do devedor (ou de terceiros responsáveis) respondem pela dívida em execução, tendo em vista a existência de normas jurídicas que mitigam o direito fundamental do credor a uma tutela jurisdicional efetiva, ao preconizarem: (i) a inalienabilidade (indisponibilidade) de certos bens; (ii) o respeito a "pacto de impenhorabilidade"; (iii) a observância ao direito fundamental de proteção da dignidade do executado e de sua família; (iv) a necessidade de preservação da função social da empresa ou da propriedade; e (v) a imprescindibilidade da defesa de interesses coletivos objeto de políticas públicas. 3. Nesse quadro se insere o rol de impenhorabilidades previsto no artigo 833 do CPC - estabelecido pelo legislador com base em juízo apriorístico de ponderação -, o qual, contudo, não impede, a depender das circunstâncias do caso concreto, que se estenda a proteção patrimonial a hipóteses nas quais sejam identificados direitos fundamentais (ou interesse público) cuja efetivação coadune-se com o fim pretendido pela norma mitigadora da tutela executiva. Tal exegese encontra guarida em precedentes desta Corte, que apontam o cabimento de interpretação sistemática, teleológica, extensiva ou restritiva das aludidas regras, assim como a aplicação do princípio da adequação. 4. O inciso IX do artigo 833 do Codex Processual determina a impenhorabilidade dos "recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social". Cuida-se de hipótese de mitigação da tutela executiva, apontando o intuito do legislador - em juízo ex ante de ponderação e numa perspectiva de sociabilidade - de prestigiar os recursos públicos com desígnios sociais e, por conseguinte, salvaguardar o direito coletivo de sujeitos indeterminados favorecidos pelos investimentos nas áreas de educação, saúde ou assistência social (REsp 1.691.882/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 9.2.2021, DJe 11.3.2021). 5. Para além do princípio da supremacia do interesse público, é certo que o dinheiro repassado pelos entes estatais - para aplicação exclusiva e compulsória em finalidade de interesse social - não chega sequer a ingressar na "esfera de disponibilidade" da instituição privada, o que constitui fundamento apto a justificar a sua impenhorabilidade não apenas por força do disposto no inciso IX do artigo 833 do CPC (que remete, expressamente, às áreas de educação, saúde e assistência social), mas também em virtude do princípio da responsabilidade patrimonial enunciado nos artigos 789 e 790 do mesmo diploma. 6. Na hipótese, revela-se incontroverso que o dinheiro - cuja penhora se requer - origina-se de recursos públicos federais repassados (em contas bancárias específicas) à Confederação Brasileira de Tênis de Mesa (CBTM) em razão de convênios e aditivos celebrados com a União (Ministério do Esporte), o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), para uso exclusivo e integral na implantação e na execução de projetos desportivos e paradesportivos no âmbito nacional. 7. A natureza eminentemente pública das verbas em comento - dada a sua afetação a uma finalidade social específica estampada nos planos de trabalho a serem obrigatoriamente seguidos pela CBTM e a previsão dos deveres de prestação de contas e de restituição do saldo remanescente - torna evidente o fato de que a instituição privada não detém a disponibilidade das referidas quantias, as quais, por conseguinte, não se incorporam ao seu patrimônio jurídico para fins de subordinação ao processo executivo. 8. Recurso especial não provido. (STJ. REsp 1.878.051-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/09/2021. - Publicado no Informativo nº 709)