STJ. RMS 56.941-DF

Enunciado: A averbação de sentença transitada em julgado, a qual declara ou reconhece determinado estado de filiação - como se dá nas ações negatórias de maternidade/paternidade, em caso de procedência -, constitui consequência legal obrigatória do que restou declarado e reconhecido judicialmente, o que se dá, ordinariamente, de ofício. Nos termos do art. 10, inciso II, do Código Civil, far-se-á a averbação de registro público dos atos judiciais e extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação. Assim, a averbação constitui ato acessório destinado a modificar o teor constante do registro, em virtude de determinação judicial, conferindo-lhe, em atenção ao princípio da veracidade, que rege o registro público, publicidade e segurança jurídica. Não existe nenhuma faculdade conferida às partes envolvidas a respeito de proceder ou não à referida averbação, como se tal providência constituísse, em si, um direito personalíssimo delas. Não há, pois, como confundir o exercício do direito subjetivo de ação de caráter personalíssimo, como o é a pretensão de desconstituir estado de filiação, cuja prerrogativa é exclusiva das pessoas insertas nesse vínculo jurídico (pai/mãe e filho), com o ato acessório da averbação da sentença de procedência transitada em julgado, que se afigura como mera consequência legal obrigatória. Na eventualidade de tal proceder não ser observado - o que, no caso, deu-se em virtude de falha do serviço judiciário (houve expedição, mas não houve o encaminhamento do mandado de averbação ao Ofício do Registro Civil das Pessoas Naturais) -, não se impõe à parte interessada o manejo de específica ação para esse propósito. A providência de averbação da sentença, por essa razão, não se submete a qualquer prazo, seja ele decadencial ou prescricional.

Tese Firmada: A averbação de sentença proferida em ação negatória de filiação não consubstancia, em si, um direito subjetivo autônomo das partes litigantes, tampouco se confunde com o direito personalíssimo ali discutido.

Questão Jurídica: Ação negatória de filiação. Sentença de procedência transitada em julgado. Averbação. Direito subjetivo e personalíssimo. Não caracterização. Consequência legal obrigatória. Art. 10, II, do Código Civil.

Ementa: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPUGNAÇÃO DE ATO JUDICIAL, DESTINADO A BEM INSTRUIR PEDIDO DE HABILITAÇÃO EM PROCESSO DE INVENTÁRIO, QUE DETERMINA A AVERBAÇÃO DE SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA EM AÇÃO NEGATÓRIA DE MATERNIDADE, TRANSITADA EM JULGADO. CONSEQUÊNCIA LEGAL OBRIGATÓRIA, EFETIVADA, ORDINARIAMENTE, DE OFÍCIO. PROVIDÊNCIA QUE NÃO SE CONFUNDE COM O DIREITO PERSONALÍSSIMO ALI DISCUTIDO; QUE DISPENSA AJUIZAMENTO DE AÇÃO PARA ESSE FIM; E QUE NÃO SE SUBMETE A QUALQUER PRAZO DECADENCIAL/PRESCRICIONAL. RECONHECIMENTO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO DO IMPETRANTE. RECURSO ORDINÁRIO IMPROVIDO. 1. A controvérsia posta no presente recurso ordinário centra-se em saber se a decisão que autoriza a expedição de mandado de averbação de sentença de procedência, exarada em ação negatória de maternidade e transitada em julgado em 1992, a fim de instruir pedido de habilitação nos autos de inventário, ofende direito líquido e certo do impetrante - o qual teve desconstituído, em face da aludida sentença, seu estado de filiação materna. 2. A averbação de sentença transitada em julgado, a qual declara ou reconhece determinado estado de filiação - como se dá nas ações negatórias de maternidade/paternidade, em caso de procedência -, constitui consequência legal obrigatória, destinada a conferir publicidade e segurança jurídica ao desfecho que restou declarado e reconhecido judicialmente, o que se dá, ordinariamente, de ofício. 2.1 Não existe nenhuma faculdade conferida às partes envolvidas a respeito de proceder ou não à referida averbação, como se tal providência constituísse, em si, um direito personalíssimo destas. Não há, pois, como confundir o exercício do direito subjetivo de ação de caráter personalíssimo, como o é a pretensão de desconstituir estado de filiação, cuja prerrogativa é exclusiva das pessoas insertas nesse vínculo jurídico (pai/mãe e filho), com o ato acessório da averbação da sentença de procedência transitada em julgado, que se afigura como mera consequência legal obrigatória. 3. Na eventualidade de tal proceder não ser observado - o que, na hipótese dos autos, deu-se em virtude de declarada falha do serviço judiciário (houve expedição, mas não houve o encaminhamento do mandado de averbação ao Oficio do Registro Civil das Pessoas Naturais) - não se impõe à parte interessada o manejo de específica ação para esse propósito. A providência de averbação da sentença, por essa razão, não se submete a qualquer prazo, seja ele decadencial ou prescricional. 4. Mostra-se descabido discutir a legitimidade dos herdeiros para promover a averbação da sentença, pois, além dessa providência não se confundir com o direito personalíssimo discutido na ação negatória de maternidade, revela-se inquestionável o interesse jurídico do espólio, representado pela inventariante, acerca da higidez do processo de inventário, sobretudo na qualificação daqueles que ingressam com pedido de habilitação, cujo registro de assentamento civil deve, necessariamente, corresponder com a realidade atual dos fatos, em atenção ao princípio da veracidade, que rege o registro público. 5. A estreita via do mandado de segurança não comporta o conhecimento de matéria concernente ao suposto estabelecimento de maternidade sócio-afetivo, que, por si, não dispensaria exauriente instrução probatória, mostrando-se, de igual modo, de todo impertinente qualquer consideração, a esse propósito, quanto aos efeitos e abrangência da coisa julgada exarada na ação negatória de maternidade. 6. A norma processual que regulamenta as hipóteses em que o processo tramita sob sigilo é expressa em autorizar que terceiros que ostentem comprovado interesse jurídico tenham acesso ao dispositivo da sentença, extraindo-se a correspondente certidão. Salientese, a esse propósito, que o fato de o processo tramitar em segredo de justiça é circunstância absolutamente indiferente à natural repercussão dos efeitos da coisa julgada. 7. Recurso ordinário improvido. (STJ. RMS 56.941-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 19/05/2020, DJe 27/05/2020 - Publicado no Informativo nº 672)