STJ. REsp 1.646.193-SP

Enunciado: O STF pronunciou a constitucionalidade do art. 15 da Lei n. 12.651/2012, por entender que "o cômputo das Áreas de Preservação Permanente no percentual de Reserva Legal resulta de legítimo exercício, pelo legislador, da função que lhe assegura o art. 225, § 1º, III, da Constituição, cabendo-lhe fixar os percentuais de proteção que atendem da melhor forma os valores constitucionais atingidos, inclusive o desenvolvimento nacional (art. 3º, II, da CRFB) e o direito de propriedade (art. 5º, XXII, da CRFB)". Tais proposições não embaraçam a compreensão de que as novas disposições normativas são irretroativas. Isto porque a Suprema Corte, ao assegurar a adequação da lei com a Carta Constitucional, não inibiu a análise da aplicação temporal do texto legal, no plano infraconstitucional, tarefa conferida ao STJ. Com efeito, o próprio STF considerou que a discussão sobre a retroatividade do art. 15 da Lei n. 12.651/2012 demanda exame de matéria cognoscível no plano infraconstitucional. Aqui convém anotar que a Corte Especial do STJ, espelhada no STF, entende que os conceitos de direito adquirido, de ato jurídico perfeito e de coisa julgada não são fixados pela Constituição Federal, mas pela legislação infraconstitucional. Desse modo, a declaração de constitucionalidade do art. 15 da Lei n. 12.651/2012 não desqualifica a aferição da aplicação imediata desse dispositivo aos casos ocorridos antes de sua vigência. Afastar a aplicação do princípio da vedação do retrocesso para prestigiar o princípio democrático, em face das "opções validamente eleitas pelo legislador", que atuou mediante a "faculdade" conferida pelo art. 225, § 1º, III, da Constituição, como fez o Supremo Tribunal Federal, não inibe a aplicação do princípio tempus regit actum, que "orienta a aplicabilidade da lei no tempo, considerando que o regime jurídico incidente sobre determinada situação deve ser aquele em vigor no momento da materialização do fato" (AgInt no REsp 1726737/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/12/2019, DJe 11/12/2019). Assim, sob o prisma de que as normas do novo Código Florestal não retroagem para alcançar situações pretéritas, dado o prestígio ao princípio do tempus regit actum e à proibição do retrocesso em matéria ambiental, a instituição da área de reserva legal se impõe à luz da legislação vigente ao tempo da infração ambiental, afastadas as disposições do art. 15 da Lei n. 12.651/2012.

Tese Firmada: O art. 15 da Lei n. 12.651/2012, que admite o cômputo da área de preservação permanente no cálculo do percentual de instituição da reserva legal do imóvel, não retroage para alcançar situações consolidadas antes de sua vigência.

Questão Jurídica: Reserva legal. Novo Código Florestal. Tempus regict actum. Art. 15. Irretroatividade. Área de preservação permanente - APP. Cômputo. Impossibilidade.

Ementa: AMBIENTAL. RESERVA LEGAL DO IMÓVEL. NOVO CÓDIGO FLORESTAL (LEI 12.651/2012). TEMPUS REGIT ACTUM. ART. 15. IRRETROATIVIDADE. ABORDAGEM INFRACONSTITUCIONAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. CÔMPUTO. IMPOSSIBILIDADE. ART. 66. REGULARIZAÇÃO. APLICABILIDADE IMEDIATA. 1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista (Enunciado Administrativo n. 3). 2. O Superior Tribunal de Justiça, em diversos julgados, tem defendido a tese de que, em matéria ambiental, deve prevalecer o princípio tempus regit actum, de forma a não se admitir a aplicação das disposições do novo Código Florestal a fatos pretéritos, sob pena de retrocesso ambiental (REsp 1728244/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2018, DJe 08/03/2019, e AgInt no REsp 1709241/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/11/2019, DJe 02/12/2019). 3. A declaração de constitucionalidade de vários dispositivos do novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012) pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADIs 4.901, 4.902 e 4.903 e da ADC 42 (DJE 13/08/2019), não inibe a análise da aplicação temporal do texto legal vigente no plano infraconstitucional, tarefa conferida ao Superior Tribunal de Justiça. 4. Ao apreciar a irretroatividade da norma ambiental, esta Corte, sem conflitar com o decidido pelo STF, não ingressa no aspecto constitucional do novo diploma legal, efetuando leitura de ordem infraconstitucional, mediante juízo realizado em campo cognitivo diverso. 5. O próprio STF considera que a discussão sobre a aplicação do novo Código Florestal a fatos pretéritos demanda análise de legislação infraconstitucional (RE 1170071 AgR, Relator Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, DJe 29/11/2019, e ARE 811441 AgR, Relator Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe 16/09/2016). 6. Nesse prisma, a declaração de constitucionalidade do art. 15 da Lei n. 12.651/2012 não desqualifica a aferição da aplicação imediata desse dispositivo aos casos ocorridos antes de sua vigência. 7. Este Tribunal considera que "o mecanismo previsto no art. 15 do novo Código Florestal acabou por descaracterizar o regime de proteção das reservas legais e, em consequência, violou o dever geral de proteção ambiental. Logo, tem-se que não merece prosperar o acórdão combatido que permitiu o cômputo de Área de Preservação Permanente no percentual exigido para instituição de Área de Reserva Legal" (AgInt no AREsp 894.313/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/09/2018, DJe 17/09/2018). 8. O art. 66 daquele diploma, ao prever hipóteses alternativas para a regularização de área de reserva legal, já traz em seu texto a possibilidade de retroação da norma, pelo que não há como afastar sua aplicação imediata. 9. Recurso especial parcialmente provido. (STJ. REsp 1.646.193-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. Acd. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, por maioria, julgado em 12/05/2020, DJe 04/06/2020 - Publicado no Informativo nº 673)