STJ. REsp 1.828.993-RS

Enunciado: Inicialmente, importante esclarecer que a Unidade de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) e a ambulância Tipo B são veículos equivalentes, conforme previsto no art. 13, § 1º, da Portaria n. 356, de 8 de abril de 2013, do Ministério da Saúde. Quando recebido o chamado de auxílio, a decisão sobre qual tipo de transporte que será enviado caberá ao médico responsável, depois de avaliado o caso pela Central de Regulação Médica de Urgência, o que dependerá da gravidade do caso concreto, bem como de sua urgência e do tipo de atendimento necessário (se traumático ou clínico). A decisão do médico pela Ambulância do Tipo B ou pela Unidade de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) só deverá acontecer, portanto, quando o veículo for destinado ao transporte inter-hospitalar de pacientes com risco de vida conhecido e ao atendimento pré-hospitalar de pacientes com risco de vida desconhecido, não classificado com potencial de necessitar de intervenção médica no local e/ou durante transporte até o serviço de destino. Por tal razão, este tipo de ambulância é tripulada por no mínimo 2 (dois) profissionais, sendo um o motorista e um técnico ou auxiliar de enfermagem. Ou seja, não se impõe a presença de enfermeiro nessa modalidade de veículo, o que não impede que o médico decida pelo envio de um enfermeiro, a depender do caso concreto, justamente por se tratar de uma tripulação mínima, conforme normatização vigente. Com relação aos atendimentos a pacientes graves, com risco de morte, ou que demandem cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica - que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas -, há previsão normativa de envio de ambulância tipo D ou Unidade de Suporte Avançado de Vida Terrestre, cuja equipe é de no mínimo 3 (três) profissionais, sendo um condutor do veículo, um enfermeiro e um médico. As Portarias n. 2.048/2002 e n. 1.010/2012, que criaram as regras descritas, não ofendem as previsões da Lei n. 7.498/1986, mas sim pelo contrário, as detalham e concretizam no plano infralegal. O art. 11 da Lei n.º 7.498/1986 determina que ao enfermeiro cabem os cuidados diretos de enfermagem a pacientes graves com risco de vida e de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas. Como visto, a Ambulância do Tipo B ou a Unidade de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) atende pacientes que não estão em estado grave, não possuem risco de morte, em casos de menor complexidade técnica. Nesses casos, é suficiente a presença de um técnico ou auxiliar de enfermagem, os quais, segundo os arts. 12 e 13 do referido diploma legal, podem exercer ações assistenciais de enfermagem que não sejam as privativas do enfermeiro. Também há pleno atendimento à prescrição do art. 15, uma vez que, as atividades são desempenhadas sob orientação e supervisão de enfermeiro, presente na Central de Regulação Médica de Urgência, não sendo imprescindível a sua presença física no veículo. A exigência de enfermeiro nas Ambulâncias de Suporte Básico - Tipo B e nas Unidades de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU, em vez de trazer benefícios, findaria por prejudicar o sistema de saúde, pois esses veículos - que compõem 80% da frota do SAMU, segundo informações prestadas como amicus curiae pelo Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde - CONASEMS - não poderiam circular sem a contratação de milhares de enfermeiros em todos os rincões do país, o que não é factível nas condições orçamentárias atuais, em clara ofensa ao princípio da reserva do possível.

Tese Firmada: A composição da tripulação das Ambulâncias de Suporte Básico - Tipo B e das Unidades de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU sem a presença de profissional de enfermagem não ofende, mas sim concretiza, o que dispõem os artigos 11, 12, 13 e 15 da Lei n. 7.498/1986, que regulamenta o exercício da enfermagem.

Questão Jurídica: Composição da tripulação das Ambulâncias de Suporte Básico - Tipo B e das Unidades de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU. Presença de profissional de enfermagem. Desnecessidade. Lei n. 7.498/1986. Portarias n. 2.048/2002 e 1.010/2012 do Ministério da Saúde. Tema 1024.

Ementa: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - IRDR. COMPOSIÇÃO DA TRIPULAÇÃO DAS AMBULÂNCIAS DE SUPORTE BÁSICO - TIPO B E DAS UNIDADES DE SUPORTE BÁSICO DE VIDA TERRESTRE (USB) DO SERVIÇO DE ATENDIMENTO MÓVEL DE URGÊNCIA - SAMU. PRESENÇA DE PROFISSIONAL DE ENFERMAGEM. DESNECESSIDADE. LEI Nº 7.498/1986. PORTARIAS Nº 2.048/2002 E 1.010/2012 DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO. RECURSO JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015, C/C O ART. 256-N E SEGUINTES DO REGIMENTO INTERNO DO STJ. 1. O objeto da presente demanda é a alegada contrariedade a diversos dispositivos da Lei nº 7.498/1986, e não a violação das portarias do Ministério da Saúde, sendo o foco da controvérsia saber se a tripulação das Ambulâncias de Suporte Básico - Tipo B e da Unidade de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) sem a presença de profissional de enfermagem fere (ou não) a normatização prescrita pela Lei n.º 7.498/1986. 2. Há posicionamentos opostos nos Tribunais Regionais Federais sobre o mérito da temática em discussão, sendo imperativo que o STJ exerça sua função primordial de uniformizar a interpretação da lei federal no Brasil, evitando que prossigam as controvérsias sobre matéria de tão alto relevo e repercussão no cotidiano da população, o que poderá gerar insegurança jurídica e falta de isonomia na prestação da saúde aos cidadãos das diferentes regiões do país. 3. Não é por outra razão que o legislador houve por bem regular de forma expressa o cabimento dos recursos extraordinário e especial contra o julgamento do mérito do IRDR, prevendo, inclusive, o efeito suspensivo automático e a presunção de repercussão geral quanto à questão constitucional eventualmente discutida, nos termos do art. 987 do CPC. 4. De toda forma, registre-se que está superada a questão do preenchimento dos requisitos de admissibilidade recursal, conforme decidido por esta Primeira Seção quando entendeu pela afetação deste feito à sistemática dos recursos especiais repetitivos. 5. Quanto ao mérito, esclareça-se que, logo quando recebido o chamado de auxílio, a decisão sobre qual tipo de transporte que será enviado caberá ao médico responsável, depois de avaliado o caso pela Central de Regulação Médica de Urgência, o que dependerá da gravidade do caso concreto, bem como de sua urgência e do tipo de atendimento necessário (se traumático ou clínico). 6. A decisão do médico pela Ambulância do Tipo B ou pela Unidade de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) só deverá acontecer, portanto, quando o veículo for destinado ao transporte inter-hospitalar de pacientes com risco de vida conhecido e ao atendimento pré-hospitalar de pacientes com risco de vida desconhecido, não classificado com potencial de necessitar de intervenção médica no local e/ou durante transporte até o serviço de destino. 7. Por tal razão, este tipo de ambulância é tripulada por no mínimo 2 (dois) profissionais, sendo um o motorista e um técnico ou auxiliar de enfermagem. Ou seja, não se impõe a presença de enfermeiro nessa modalidade de veículo, o que não impede que o médico decida pelo envio de um enfermeiro, a depender do caso concreto, justamente por se tratar de uma tripulação mínima, conforme normatização vigente. 8. Com relação aos atendimentos a pacientes graves, com risco de morte, ou que demandem cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica - que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas -, há previsão normativa de envio de ambulância tipo D ou Unidade de Suporte Avançado de Vida Terrestre, cuja equipe é de no mínimo 3 (três) profissionais, sendo um condutor do veículo, um enfermeiro e um médico. 9. As Portarias nº 2.048/2002 e nº 1.010/2012, que criaram as regras descritas, não ofendem as previsões da Lei n.º 7.498/1986, mas sim pelo contrário, as detalham e concretizam no plano infralegal. 10. Mesmo que se enfoque a controvérsia sob um prisma mais pragmático e consequencialista, a solução não se altera. Em um mundo ideal, seria interessante que cada ambulância, independentemente do tipo de atendimento que lhe cumprisse prestar, tivesse em sua tripulação enfermeiros e até mesmo médicos. Entretanto, não é essa a realidade dos fatos, especialmente no Brasil, país de conhecidas desigualdades sociais e regionais. 11. A exigência de enfermeiro nas Ambulâncias de Suporte Básico - Tipo B e nas Unidades de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU, em vez de trazer benefícios, findaria por prejudicar o sistema de saúde, pois esses veículos - que compõem 80% da frota do SAMU, segundo informações prestadas como amicus curiae pelo CONSELHO NACIONAL DE SECRETARIAS MUNICIPAIS DE SAÚDE - CONASEMS - não poderiam circular sem a contratação de milhares de enfermeiros em todos os rincões do país, o que não é factível nas condições orçamentárias atuais, em clara ofensa ao princípio da reserva do possível. 12. Tese jurídica firmada: "A composição da tripulação das Ambulâncias de Suporte Básico - Tipo B e das Unidades de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU sem a presença de profissional de enfermagem não ofende, mas sim concretiza, o que dispõem os artigos 11, 12, 13 e 15 da Lei n.º 7.498/86, que regulamenta o exercício da enfermagem.". 13. Recurso especial conhecido e não provido. 14. Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e art. 256-N e seguintes do Regimento Interno deste STJ. (STJ. REsp 1.828.993-RS, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/08/2020, DJe 20/08/2020. - Publicado no Informativo nº 678)