STJ. EREsp 1.335.535-RJ

Enunciado: A disciplina normativa, pela União, das águas subterrâneas - reputadas ora federais, ora estaduais -, é justificada por constituírem recurso natural, público, limitado, não visível a olho nu (ao contrário das águas de superfície), e indispensável à concretização dos direitos fundamentais à vida, à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Na disciplina dos recursos hídricos, dois diplomas federais são de observância obrigatória para Estados, Distrito Federal e Municípios: a Lei n. 9.433/1997 (Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos) e a Lei n. 11.445/2007 (Lei do Saneamento Básico). A primeira condiciona a extração de água subterrânea - quer para "consumo final", quer como "insumo de processo produtivo" - à prévia e válida outorga pelo Poder Público, o que se explica pela notória escassez desse precioso bem, literalmente vital, de enorme e crescente valor econômico, mormente diante das mudanças climáticas (art. 12, II). Já o art. 45, § 2º, da Lei n. 11.445/2007 prevê categoricamente que "a instalação hidráulica predial ligada à rede pública de abastecimento de água não poderá ser também alimentada por outras fontes". Assim, patente a existência de disciplina normativa expressa, categórica e inafastável de lei geral federal, que veda captação de água subterrânea para uso de núcleos residenciais, sem que haja prévia outorga e autorização ambiental do Poder Público. As normas locais devem seguir as premissas básicas definidas pela legislação federal. Estatuto editado por Estado, Distrito Federal ou Município que contrarie as diretrizes gerais fixadas nacionalmente padece da mácula de inconstitucionalidade e ilegalidade, por afrontar a distribuição de competência feita pelo constituinte de 1988: "Compete privativamente à União legislar sobre ... águas" (art. 22, IV, da Constituição Federal).

Tese Firmada: É vedada a captação de água subterrânea para uso de núcleos residenciais, sem que haja prévia outorga e autorização ambiental do Poder Público.

Questão Jurídica: Recursos hídricos. Condomínio residencial. Poço artesiano. Federalismo hídrico-ambiental. Regime jurídico das águas subterrâneas. Outorga e autorização ambiental. Necessidade.

Ementa: AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS HÍDRICOS. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. CONDOMÍNIO RESIDENCIAL. POÇO ARTESIANO. FEDERALISMO HÍDRICO-AMBIENTAL. REGIME JURÍDICO DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS. ART. 12, II, DA LEI .433/1997 E ART. 45, § 2º, DA LEI 11.445/1997. NECESSIDADE DE OUTORGA E AUTORIZAÇÃO AMBIENTAL. PRECEDENTES. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Trata-se, na origem, de Ação de Obrigação de Fazer proposta pelo Condomínio do Parque Residencial Ypiranga que, sob o argumento de haver insuficiência do abastecimento público de água, realizou perfuração de poço artesiano para uso dos condôminos, sem outorga e autorização ambiental. 2. A sentença julgou procedentes os pedidos. O Tribunal de origem negou provimento à Apelação, entendendo, em síntese, que inexiste na legislação federal ou estadual obrigação de outorga ou autorização do órgão público competente para uso de água extraída de poços artesianos. 3. O INEA interpôs Recurso Especial alegando violação do art. 45, § 2º, da Lei federal 11.445/2007 (Lei do Saneamento Básico) que veda a quem possui instalação hidráulica predial ligada à rede pública abastecer-se de fontes alternativas. REGIME JURÍDICO DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS 4. Qualquer que seja o ângulo pelo qual se examine a questão, justifica-se a disciplina normativa, pela União, das águas subterrâneas - reputadas ora federais, ora estaduais -, por constituírem recurso natural, público, limitado, não visível a olho nu (ao contrário das águas de superfície), e indispensável à concretização dos direitos fundamentais à vida, à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 5. Na disciplina dos recursos hídricos, dois diplomas federais são de observância obrigatória para Estados, Distrito Federal e Municípios: a Lei 9.433/1997 (Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos) e a Lei 11.445/2007 (Lei do Saneamento Básico). A Lei 9.433/1997 condiciona a extração de água subterrânea - quer para "consumo final", quer como "insumo de processo produtivo" - à prévia e válida outorga pelo Poder Público, o que se explica pela notória escassez desse precioso bem, literalmente vital, de enorme e crescente valor econômico, mormente diante das mudanças climáticas (art. 12, II). Já o art. 45, § 2º, da Lei 11.445/2007 prevê categoricamente que "a instalação hidráulica predial ligada à rede pública de abastecimento de água não poderá ser também alimentada por outras fontes". 6. Assim, patente a existência de disciplina normativa expressa, categórica e inafastável de lei geral federal, que veda captação de água subterrânea para uso de núcleos residenciais, sem que haja prévia outorga e autorização ambiental do Poder Público. As normas locais devem seguir as premissas básicas definidas pela legislação federal. Estatuto editado por Estado, Distrito Federal ou Município que contrarie as diretrizes gerais fixadas nacionalmente padece da mácula de inconstitucionalidade e ilegalidade, por afrontar a distribuição de competência feita pelo constituinte de 1988: "Compete privativamente à União legislar sobre ... águas" (art. 22, IV, da Constituição Federal, grifo acrescentado). Precedentes do STJ. CONCLUSÃO 7. Embargos de Divergência conhecidos e providos. (STJ. EREsp 1.335.535-RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 26/09/2018, DJe 03/09/2020 - Publicado no Informativo nº 678)