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STJ. REsp 1.879.503-RJ
Enunciado: Cinge-se a controvérsia a definir a obrigação de o ex-empregador em manter, com base na proteção da confiança (supressio), o plano de saúde oferecido ao ex-empregado, transcorridos mais de 10 anos do rompimento do vínculo empregatício. Com efeito, não se nega que o art. 30, § 1º, da Lei n. 9.656/1998 permite que o ex-empregado demitido e seu grupo familiar se mantenham no plano de saúde coletivo empresarial, após o rompimento do vínculo empregatício, pelo período de um terço do tempo de permanência como beneficiários, com um mínimo assegurado de seis meses e um máximo de vinte e quatro meses. Há, no entanto, uma circunstância relevante na hipótese, o empregado e sua esposa permaneceram, depois da demissão do primeiro, vinculados ao mesmo plano, nas mesmas condições, por mais dez anos, tendo, apenas, assumido o custeio integral do serviço, circunstância que, segundo o Tribunal de origem, é apta "a despertar no autor a confiança legítima na manutenção vitalícia do benefício". O desate da controvérsia exige, portanto, a análise desse cenário à luz da chamada responsabilidade pela confiança. Confiança, a propósito, é, na lição doutrinária, "a face subjetiva do princípio da boa-fé"; "é a legítima expectativa que resulta de uma relação jurídica fundada na boa-fé"; e, por isso, segundo a doutrina, "frustração é o sentimento que ocupa o lugar de uma expectativa não satisfeita". A responsabilidade pela confiança constitui, portanto, uma das vertentes da boa-fé objetiva, enquanto princípio limitador do exercício dos direitos subjetivos, e coíbe o exercício abusivo do direito, o qual, no particular, se revela como uma espécie de não-exercício abusivo do direito, de que é exemplo a supressio. A supressio, por usa vez, indica a possibilidade de se considerar suprimida determinada obrigação contratual na hipótese em que o não exercício do direito correspondente, pelo credor, gerar no devedor a legítima expectativa de que esse não exercício se prorrogará no tempo. Implica, assim, a redução do conteúdo obrigacional pela inércia qualificada de uma das partes, ao longo da execução do contrato, em exercer determinado direito ou faculdade, criando para a outra a percepção válida e plausível - a ser apurada casuisticamente - de ter havido a renúncia àquela prerrogativa. Convém ressaltar, nessa toada, que o abuso do direito - aqui caracterizado pela supressio - é qualificado pelo legislador como espécie de ato ilícito (art. 187 do CC/2002), no qual, em verdade, não há desrespeito à regra de comportamento extraída da lei, mas à sua valoração; o agente atua conforme a legalidade estrita, mas ofende o elemento teleológico que a sustenta, descurando do dever ético que confere a adequação de sua conduta ao ordenamento jurídico. Sob essa ótica, verifica-se que o ex-empregado e sua esposa se mantiveram vinculados ao contrato de plano de saúde por 10 anos, superando - e muito - o prazo legal que autorizava a sua exclusão, o que, evidentemente, despertou naqueles a justa expectativa de que não perderiam o benefício oferecido pelo ex-empregador. E, de fato, o exercício reiterado dessa liberalidade, consolidado pelo decurso prolongado do tempo, é circunstância apta a criar a confiança na renúncia do direito de excluir o ex-empregado e seu grupo familiar do contrato de plano de saúde, de tal modo que, esse exercício agora, quando já passados 10 anos, e quando os beneficiários já contavam com idade avançada, gera uma situação de desequilíbrio inadmissível entre as partes, que se traduz no indesejado sentimento de frustação. Diante desse panorama, o princípio da boa-fé objetiva torna inviável a exclusão do ex-empregado e sua esposa do plano de saúde coletivo empresarial.
Tese Firmada: Ex-empregado mantido no plano de saúde por mais de dez anos após a demissão, por liberalidade do ex-empregador e com assunção de custeio integral do serviço, não poderá ser excluído da cobertura do seguro.
Questão Jurídica: Plano de saúde coletivo empresarial. Rompimento do vínculo empregatício. Manutenção do ex-empregado e sua esposa como beneficiários do plano de saúde por 10 anos. Exclusão indevida pelo ex-empregador. Responsabilidade pela confiança. Abuso do direito. Supressio.
Ementa: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZATÓRIA. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚM. 284/STF. ALEGADA OFENSA À RESOLUÇÃO DO CONSU. NÃO CABIMENTO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚM. 211/STJ. FUNDAMENTO NÃO IMPUGNADO. SÚM. 283/STF. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. DISSÍDIO NÃO DEMONSTRADO. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL. ROMPIMENTO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO. MANUTENÇÃO DO EX-EMPREGADO E SUA ESPOSA COMO BENEFICIÁRIOS DO PLANO DE SAÚDE POR 10 ANOS. EXCLUSÃO INDEVIDA PELO EX-EMPREGADOR. RESPONSABILIDADE PELA CONFIANÇA. ABUSO DO DIREITO. SUPRESSIO. JULGAMENTO: CPC/2015. 1. Ação de obrigação de fazer c/c indenizatória ajuizada em 19/08/2013, da qual foram extraídos os presentes recursos especiais, interpostos, ambos, em 30/08/2018, e atribuídos ao gabinete em 14/05/2020. 2. O propósito do primeiro recurso especial é dizer sobre: (i) a negativa de prestação jurisdicional; (ii) a obrigação de o ex-empregador manter, com base na proteção da confiança (supressio), o plano de saúde oferecido ao ex-empregado, transcorridos mais de 10 anos do rompimento do vínculo empregatício; (iii) o termo final da obrigação do ex-empregador de indenizar o ex-empregado dos valores despendidos com a contratação de outro plano de saúde. 3. O propósito do segundo recurso especial é dizer sobre (i) a negativa de prestação jurisdicional; (ii) o julgamento fora do pedido (extra petita); (iii) a obrigação da seguradora de disponibilizar plano de saúde individual que não comercializa; (iv) a ofensa à competência da ANS; (v) a impossibilidade de manutenção do plano de saúde em favor dos beneficiários que não contribuíam. 4. Os argumentos deduzidos pela recorrente não demonstram, concretamente, os pontos omitidos pelo Tribunal de origem, tampouco evidenciam a efetiva relevância das questões para a resolução da controvérsia, a justificar a alegada negativa de prestação jurisdicional (Súmula 284/STF). 5. A interposição de recurso especial não é cabível com fundamento em violação de resolução do Consu, porque esse ato normativo não se enquadra no conceito de lei federal previsto no art. 105, III, "a" da CF/88. 6. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados ou dos argumentos deduzidos nas razões recursais, a despeito da oposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial (súm. 211/STJ). 7. A existência de fundamento não impugnado - quando suficiente para a manutenção das conclusões do acórdão recorrido - impede a apreciação do recurso especial (súm. 283/STF). 8. A análise da existência do dissídio jurisprudencial é inviável quando descumpridos os arts. 1.029, § 1º, do CPC/15 (541, parágrafo único, do CPC/73) e 255, § 1º, do RISTJ. 9. Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e suficientemente fundamentado o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há falar em violação do art. 1.022, II, do CPC/15. 10. A responsabilidade pela confiança constitui uma das vertentes da boa-fé objetiva, enquanto princípio limitador do exercício dos direitos subjetivos, e coíbe o exercício abusivo do direito, o qual, no particular, se revela como uma espécie de não-exercício abusivo do direito, de que é exemplo a supressio. 11. O abuso do direito - aqui caracterizado pela supressio - é qualificado pelo legislador como espécie de ato ilícito (art. 187 do CC/2002), no qual, em verdade, não há desrespeito à regra de comportamento extraída da lei, mas à sua valoração; o agente atua conforme a legalidade estrita, mas ofende o elemento teleológico que a sustenta, descurando do dever ético que confere a adequação de sua conduta ao ordenamento jurídico. 12. Hipótese excepcional em que, por liberalidade do ex-empregador, o ex-empregado e sua esposa, assumindo o custeio integral, permaneceram vinculados ao contrato de plano de saúde por prazo que supera - e muito - o previsto no art. 30, § 1º, da Lei 9.656/1998, despertando nestes a confiança de que não perderiam o benefício, de tal modo que sua exclusão agora, quando já passados 10 anos, e quando já contam com idade avançada, torna-se inviável, segundo o princípio da boa-fé objetiva. 13. Recurso especial de BRADESCO SAÚDE S/A não conhecido. Recurso especial de UNIPAR-UNIÃO DE INDÚSTRIAS PETROQUÍMICAS S.A conhecido em parte e, nessa extensão, desprovido. (STJ. REsp 1.879.503-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 15/09/2020, DJe 18/09/2020 - Publicado no Informativo nº 680)