STJ. REsp 1.774.434-RS

Enunciado: Quanto à constituição das cooperativas, o art. 3º da Lei n. 5.764/1971 dispõe que "celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro". Sob a perspectiva da legislação civil, resta patente que são sociedades, e não associações, pois estas não admitem a existência de finalidade econômica, nos termos do art. 53do CC/2002. Segundo o art. 4º da Lei n. 5.764/1971, "as cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados". São diversas as peculiaridades normativas na disciplina das cooperativas, de maneira que a aplicação subsidiária da legislação civil e comercial deve guardar observância estrita de modo a não confundir seu tratamento com as demais sociedades em geral. Apenas em hipótese de omissão legal no que tange à disciplina das sociedades cooperativas, aplicam-se as disposições referentes à sociedade simples (art. 1.096 do CC/2002). Nessa linha, deve prevalecer o disposto na lei especial em detrimento das previsões das leis gerais, como o Código Comercial e o Código Civil, na disciplina normativa da responsabilidade dos associados acerca dos débitos contraídos pela sociedade cooperativa. Assim, os prejuízos verificados no decorrer do exercício serão cobertos com recursos provenientes do Fundo de Reserva e, se insuficiente este, mediante rateio, entre os associados, na razão direta dos serviços usufruídos (art. 89 da Lei n. 5.764/1971). Dessa forma, inadmissível limitar a responsabilidade do ex-associado, pelo rateio dos prejuízos acumulados, somente até dois anos de seu desligamento da cooperativa, ante a prevalência do disposto no Estatuto Social e a correspondente decisão da Assembleia Geral.

Tese Firmada: A responsabilidade do ex-cooperado, pelo rateio dos prejuízos acumulados, não se limita ao prazo disposto para as sociedades simples previsto nos arts. 1.003, parágrafo único, e 1.032, ambos do CC/2002, de até dois anos de seu desligamento da cooperativa.

Questão Jurídica: Sociedades cooperativas. Prejuízos que superam o fundo de reserva. Responsabilidade dos ex-associados. Rateio na razão direta dos serviços usufruídos. Limitação somente até dois anos do desligamento (arts. 1.003 e 1.032 do Código Civil/2002). Inaplicabilidade.

Ementa: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. SOCIEDADES COOPERATIVAS. DISTRIBUIÇÃO DE RESPONSABILIDADE DOS ASSOCIADOS ADMITIDOS, DEMITIDOS, ELIMINADOS OU EXCLUÍDOS. ESTATUTO SOCIAL. PREJUÍZOS QUE SUPERAM O FUNDO DE RESERVA. RATEIO NA RAZÃO DIRETA DOS SERVIÇOS USUFRUÍDOS. LIMITAÇÃO SOMENTE ATÉ DOIS ANOS DO DESLIGAMENTO DA COOPERATIVA. IMPOSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. CONCORRÊNCIA DE NORMAS NO TEMPO. REGRA DE TRANSIÇÃO. ATO COOPERATIVO. PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL. 1. Ação de cobrança ajuizada em 05/03/10. Recurso especial interposto em 19/03/15 e atribuído ao gabinete em 25/08/16. 2. O propósito recursal consiste em dizer: i) da aplicação dos arts. 1.003, parágrafo único, 1.032, ambos do CC/02, à sociedade cooperativa; ii) qual o prazo prescricional para cobrança de ato cooperativo. 3. Apenas em hipótese de omissão legal no que tange à disciplina das sociedades cooperativas, aplicam-se as disposições referentes à sociedade simples (art. 1.096, do CC/02). 4. Os prejuízos verificados no decorrer do exercício serão cobertos com recursos provenientes do Fundo de Reserva e, se insuficiente este, mediante rateio, entre os associados, na razão direta dos serviços usufruídos (art. 89, da Lei 5.764/71). 5. Inadmissível o propósito recursal de limitar a responsabilidade do ex-associado, pelo rateio dos prejuízos acumulados, somente até dois anos de seu desligamento da cooperativa, ante a prevalência do disposto no Estatuto Social e a correspondente decisão da Assembleia Geral. 6. Na ausência de disciplina específica sobre a prescrição da cobrança de ato cooperativo, deve incidir o prazo prescricional geral de dez anos, previsto no art. 205, do CC/02. 7. Na hipótese dos autos, observada a regra de transição do art. 2.028, do CC/02, não se verifica o implemento da prescrição da pretensão de cobrança formulada pela cooperativa em face do ex-associado. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (STJ. REsp 1.774.434-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 01/09/2020, DJe 12/11/2020 - Publicado no Informativo nº 682)