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STF. ADPF MC-Ref 850/DF
Tese Firmada: O modelo de elaboração e execução das despesas oriundas de emendas do relator-geral do orçamento viola o princípio republicano e os postulados informadores do regime de transparência no uso dos recursos financeiros do Estado (1).
Questão Jurídica: Emendas do relator-geral do orçamento e transparência no uso dos recursos financeiros
Ementa: Arguição de descumprimento de preceito fundamental. Despesas públicas decorrentes de emendas do relator do projeto de lei orçamentária anual. Pretensão de inconstitucionalidade fundada tanto em situações verificáveis no plano objetivo-normativo (práticas institucionais) quanto em alegações somente passíveis de constatação por meio de investigação fático-probatória (condutas individuais). Inadmissibilidade do conhecimento da arguição de descumprimento quanto ao suposto esquema de desvio de verbas públicas denominado “tratoraço”. Controvérsia cuja análise demanda aprofundado exame de fatos e instauração incidental de fase de dilação probatória. Impossibilidade de exame de fatos concretos e situações específicas em sede de processos de perfil objetivo. Execução orçamentária e financeira das emendas do relator (classificadas pelo identificador RP 9). Constatação objetiva da ocorrência de transgressão aos postulados republicanos da transparência, da publicidade e da impessoalidade no âmbito da gestão estatal dos recursos públicos. práticas institucionais condescendentes com a ocultação dos autores e beneficiários das despesas decorrentes de emendas do relator do orçamento federal. Modelo que institui inadmissível exceção ao regime de transparência no âmbito dos instrumentos orçamentários. Medida cautelar deferida. Referendo. 1. As práticas institucionais e padrões de comportamento verificáveis objetivamente na esfera dos Poderes Públicos traduzem formas de atuação estatal subsumíveis à noção jurídica de atos de poder (Lei nº 9.882/99, art. 1º, caput). Precedentes. 2. A jurisprudência desta Corte reconhece possível a utilização da arguição de descumprimento para impugnar omissões sistêmicas e práticas institucionais dos Poderes Públicos, sempre que – diante da inexistência de outro meio capaz de sanar a controvérsia de forma geral, imediata, eficaz – os atos impugnados, transcendendo interesses meramente individuais, ostentam os atributos da generalidade, da impessoalidade e da abstração, justificando a intervenção judicial para a tutela de direitos fundamentais ou de interesses políticos e jurídicos socialmente relevantes. Precedentes. 3. A natureza dos processos de índole objetiva é incompatível com a análise aprofundada de fatos envolvendo supostas práticas ilícitas, atos de improbidade administrativa ou infrações criminais imputadas a particulares, servidores públicos ou autoridades políticas, pois a apuração desses fatos, além de envolver ampla dilação probatória, também exige a observância dos postulados que informam o devido processo legal, especialmente o contraditório e a ampla defesa. Precedentes. 4. O Congresso Nacional institucionalizou uma duplicidade de regimes de execução das emendas parlamentares: o regime transparente próprio às emendas individuais e de bancada e o sistema anônimo de execução das despesas decorrentes de emendas do relator. Isso porque, enquanto as emendas individuais e de bancada vinculam o autor da emenda ao beneficiário das despesas, tornando claras e verificáveis a origem e a destinação do dinheiro gasto, as emendas do relator operam com base na lógica da ocultação dos efetivos requerentes da despesa, por meio da utilização de rubrica orçamentária única (RP 9), na qual todas as despesas previstas são atribuídas, indiscriminadamente, à pessoa do relator-geral do orçamento, que atua como figura interposta entre parlamentares incógnitos e o orçamento público federal. 5. Enquanto a disciplina normativa da execução das emendas individuais e de bancada (RP 6 e RP 7) orienta-se pelos postulados da transparência e da impessoalidade, o regramento pertinente às emendas do relator (RP 9) distancia-se desses ideais republicanos, tornando imperscrutável a identificação dos parlamentares requerentes e destinatários finais das despesas nelas previstas, em relação aos quais, por meio do identificador RP 9, recai o signo do mistério. 6. Mostra-se em tudo incompatível com a forma republicana e o regime democrático de governo a validação de práticas institucionais por órgãos e entidades públicas que, estabelecidas à margem do direito e da lei, promovam o segredo injustificado sobre os atos pertinentes à arrecadação de receitas, efetuação de despesas e destinação de recursos financeiros, com evidente prejuízo do acesso da população em geral e das entidades de controle social aos meios e instrumentos necessários ao acompanhamento e à fiscalização da gestão financeira do Estado. Precedentes. 7. Medida cautelar deferida, “ad referendum” do Plenário, para determinar a adoção das seguintes medidas: (a) quanto ao orçamento dos exercícios de 2020 e de 2021, ampla publicização aos documentos embasadores da distribuição de recursos das emendas de relator-geral (RP-9); (b) quanto à execução das despesas indicadas pelo classificador RP 9 (despesas decorrentes de emendas do relator do projeto de lei orçamentária anual), implementação de medidas para que todas as demandas de parlamentares voltadas à distribuição de emendas de relator-geral, independentemente da modalidade de aplicação, sejam registradas em plataforma eletrônica centralizada, em conformidade com os princípios da publicidade e transparência (CF, arts. 37, caput, e 163-A); e (c) quanto ao orçamento do exercício de 2021, a suspensão integral e mediata da execução dos recursos orçamentários oriundos do identificador de resultado primário nº 9 (RP 9), até final julgamento de mérito desta arguição de descumprimento. 8. Medida liminar referendada. (ADPF 850 MC-Ref, Relator(a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 11/11/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-054 DIVULG 21-03-2022 PUBLIC 22-03-2022)