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STJ. Tema Repetitivo nº 1204
Tese Firmada: As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo possível exigi-las, à escolha do credor, do proprietário ou possuidor atual, de qualquer dos anteriores, ou de ambos, ficando isento de responsabilidade o alienante cujo direito real tenha cessado antes da causação do dano, desde que para ele não tenha concorrido, direta ou indiretamente.
Questão Jurídica: As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores ou, ainda, dos sucessores, à escolha do credor.
Ementa: AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA DE NATUREZA REPETITIVA. DANO AMBIENTAL. OBRIGAÇÃO DE REPARAÇÃO. ARTS. 3º, IV, E 14, § 1º, DA LEI 6.938/81. NATUREZA PROPTER REM E SOLIDÁRIA. POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO DOS ATUAIS POSSUIDORES OU PROPRIETÁRIOS, ASSIM COMO DOS ANTERIORES, OU DE AMBOS. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. I. Recurso Especial interposto contra acórdão publicado na vigência do CPC/2015, aplicando-se, no caso, o Enunciado Administrativo 3/2016, do STJ, aprovado na sessão plenária de 09/03/2016 ("Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC"). II. A controvérsia ora em apreciação, submetida ao rito dos recursos especiais repetitivos, nos termos dos arts. 1.036 a 1.041 do CPC/2015, restou assim delimitada: "As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores ou, ainda, dos sucessores, à escolha do credor". III. A matéria afetada encontra atualmente consubstanciada na Súmula 623/STJ, publicada no DJe de 17/12/2018: "As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor". IV. Esse enunciado sumular lastreia-se em jurisprudência do STJ que, interpretando a legislação de regência, consolidou entendimento no sentido de que "a obrigação de reparação dos danos ambientais é propter rem, por isso que a Lei 8.171/91 vigora para todos os proprietários rurais, ainda que não sejam eles os responsáveis por eventuais desmatamentos anteriores, máxime porque a referida norma referendou o próprio Código Florestal (Lei 4.771/65) que estabelecia uma limitação administrativa às propriedades rurais (...)" (REsp 1.090.968/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJe de 03/08/2010). Segundo essa orientação, o atual titular que se mantém inerte em face de degradação ambiental, ainda que pré-existente, comete ato ilícito, pois a preservação das áreas de preservação permanente e da reserva legal constituem "imposições genéricas, decorrentes diretamente da lei. São, por esse enfoque, pressupostos intrínsecos ou limites internos do direito de propriedade e posse (. ..) quem se beneficia da degradação ambiental alheia, a agrava ou lhe dá continuidade não é menos degradador" (STJ, REsp 948.921/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 11/11/2009). No mesmo sentido: "Não há cogitar, pois, de ausência de nexo causal, visto que aquele que perpetua a lesão ao meio ambiente cometida por outrem está, ele mesmo, praticando o ilícito" (STJ, REsp 343.741/PR, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, SEGUNDA TURMA, DJU de 07/10/2002). Atualmente, o art. 2º, § 2º, da Lei 12.651/2012 expressamente atribui caráter ambulatorial à obrigação ambiental, ao dispor que "as obrigações previstas nesta Lei têm natureza real e são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural". Tal norma, somada ao art. 14, § 1º, da Lei 6.938/81 - que estabelece a responsabilidade ambiental objetiva -, alicerça o entendimento de que "a responsabilidade pela recomposição ambiental é objetiva e propter rem, atingindo o proprietário do bem, independentemente de ter sido ele o causador do dano" (STJ, AgInt no REsp 1.856.089/MG, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 25/06/2020). V. De outro lado, o anterior titular de direito real, que causou o dano, também se sujeita à obrigação ambiental, porque ela, além de ensejar responsabilidade civil, ostenta a marca da solidariedade, à luz dos arts. 3º, IV, e 14, § 1º, da Lei 6.938/81, permitindo ao demandante, à sua escolha, dirigir sua pretensão contra o antigo proprietário ou possuidor, contra os atuais ou contra ambos. Nesse sentido: "A ação civil pública ou coletiva por danos ambientais pode ser proposta contra poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental (art. 3º, IV, da Lei 6.898/91), co-obrigados solidariamente à indenização, mediante a formação litisconsórcio facultativo" (STJ, REsp 884.150/MT, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJe de 07/08/2008). E ainda: "Na linha da Súmula 623, cabe relembrar que a natureza propter rem não afasta a solidariedade da obrigação ambiental. O caráter adesivo da obrigação, que acompanha o bem, não bloqueia a pertinência e os efeitos da solidariedade. Caracterizaria verdadeiro despropósito ético-jurídico que a feição propter rem servisse para isentar o real causador (beneficiário da deterioração) de responsabilidade" (STJ, AgInt no AREsp 1.995.069/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 05/09/2022). VI. Assim, de acordo com a mais atual jurisprudência do STJ, "a responsabilidade civil por danos ambientais é propter rem, além de objetiva e solidária entre todos os causadores diretos e indiretos do dano" (AgInt no AREsp 2.115.021/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 16/03/2023). VII. Situação que merece exame particularizado é a do anterior titular que não deu causa a dano ambiental ou a irregularidade. A hipótese pode ocorrer de duas formas. A primeira acontece quando o dano é posterior à cessação do domínio ou da posse do alienante, situação em que ele, em regra, não pode ser responsabilizado, a não ser que, e.g., tenha ele, mesmo já sem a posse ou a propriedade, retornado à área, a qualquer outro título, para degradá-la, hipótese em que responderá, como qualquer agente que realiza atividade causadora de degradação ambiental, com fundamento no art. 3º, IV, da Lei 6.938/81, que prevê, como poluidor, o "responsável direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental". Isso porque a obrigação do anterior titular baseia-se no aludido art. 3º, IV, da Lei 6.938/81, que torna solidariamente responsável aquele que, de alguma forma, realiza "atividade causadora de degradação ambiental", e, consoante a jurisprudência, embora a responsabilidade civil ambiental seja objetiva, "há de se constatar o nexo causal entre a ação ou omissão e o dano causado, para configurar a responsabilidade" (STJ, AgRg no REsp 1.286.142/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 28/02/2013). Em igual sentido: "A responsabilidade por danos ambientais é objetiva e, como tal, não exige a comprovação de culpa, bastando a constatação do dano e do nexo de causalidade. Excetuam-se à regra, dispensando a prova do nexo de causalidade, a responsabilidade de adquirente de imóvel já danificado porque, independentemente de ter sido ele ou o dono anterior o real causador dos estragos, imputa-se ao novo proprietário a responsabilidade pelos danos. Precedentes do STJ. A solidariedade nessa hipótese decorre da dicção dos arts. 3º, inc. IV, e 14, § 1º, da Lei 6.398/1981 (Lei da Política Nacional do Meio Ambiente)" (STJ, REsp 1.056.540/GO, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe de 14/09/2009). A segunda situação a ser examinada é a do anterior titular que conviveu com dano ambiental pré-existente, ainda que a ele não tenha dado causa, alienando o bem no estado em que o recebera. Nessa hipótese, não há como deixar de reconhecer a prática de omissão ilícita, na linha da jurisprudência do STJ, que - por imperativo ético e jurídico - não admite que aquele que deixou de reparar o ilícito, e eventualmente dele se beneficiou, fique isento de responsabilidade. Nessa direção: "Para o fim de apuração do nexo de causalidade no dano ambiental, equiparam-se quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem não se importa que façam, quem financia para que façam, e quem se beneficia quando outros fazem" (STJ, REsp 650.728/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 02/12/2009). Sintetizando esse entendimento, conclui-se que o anterior titular só não estará obrigado a satisfazer a obrigação ambiental quando comprovado que não causou o dano, direta ou indiretamente, e que este é posterior à cessação de sua propriedade ou posse. VIII. No caso concreto, o acórdão recorrido conta com motivação suficiente e não deixou de se manifestar sobre a matéria cujo conhecimento lhe competia, permitindo, por conseguinte, a exata compreensão e resolução da controvérsia, não havendo falar em descumprimento aos arts. 489, § 1º, VI, e 1.022, II, do CPC/2015, tal como demonstra o parecer ministerial. IX. No mérito, é incontroverso que as partes firmaram, em 11/12/2006, Termo de Ajustamento de Conduta, no qual se pactuou que a parte ora recorrida viria a requerer, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, à Secretaria de Estado de Meio Ambiente - SEMA/MS ou Instituto do Meio Ambiente - Pantanal - IMAP, atual IMASUL, licenciamento ou autorização conforme as exigências da Lei 4.771/65. Comprometeu-se a parte recorrida, ainda, a encaminhar, em 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias, documentação que atendesse às exigências da mesma Lei. Nenhuma das obrigações foi satisfeita, pelo que o Juízo de 1º Grau determinou a sua conversão em perdas e danos, com realização de perícia, a ser custeada pela ora recorrida. Considerando que, em 13/03/2008, o imóvel objeto do TAC, Fazenda Olho D´Água, teve sua propriedade transferida para terceiro, o Tribunal de origem declarou a ilegitimidade da parte recorrida para ocupar o polo passivo da execução, entendendo que a natureza propter rem da obrigação isentaria o anterior proprietário de responsabilidade, "mormente para efetuar o pagamento dos honorários periciais". X. O acórdão recorrido está em desacordo com o entendimento fixado no presente julgamento, razão pela qual merece ele reforma, para restabelecer a decisão de 1º Grau que, reconhecendo a responsabilidade ambiental e a legitimidade passiva da parte ora recorrida, atribuiu-lhe o ônus de pagar honorários periciais para apuração do valor das perdas e danos decorrentes do inadimplemento das obrigações de fazer, impostas no Termo de Ajustamento de Conduta. XI. Tese jurídica firmada: "As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo possível exigi-las, à escolha do credor, do proprietário ou possuidor atual, de qualquer dos anteriores, ou de ambos, ficando isento de responsabilidade o alienante cujo direito real tenha cessado antes da causação do dano, desde que para ele não tenha concorrido, direta ou indiretamente." XII. Caso concreto: Recurso Especial conhecido e provido. XIII. Recurso julgado sob a sistemática dos recursos especiais representativos de controvérsia (art. 1.036 e seguintes do CPC/2005 e art. 256-N e seguintes do RISTJ). (REsp n. 1.962.089/MS, relatora Ministra Assusete Magalhães, Primeira Seção, julgado em 13/9/2023, DJe de 26/9/2023.)