STJ. REsp 1.986.629-RJ

Enunciado: A controvérsia está em definir se somente configura o crime de milícia privada se o grupo praticar exclusivamente delitos previstos no Código Penal. Na hipótese, o Tribunal estadual desclassificou o crime de constituição de milícia privada (art. 288-A do CP) para o delito de associação criminosa armada (art. 288, parágrafo único, do CP), mais favorável ao réus, em razão de o grupo criminoso não ter se limitado a praticar somente os delitos dispostos no Código Penal, destacando que também praticavam outros crimes previstos em legislação extravagante, notadamente o porte ou posse ilegal de arma de fogo. Com efeito, comete o crime de constituição de milícia privada, nos termos do art. 288-A do Código Penal, quem "Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código." Depreende-se da interpretação literal da norma acima descrita, que o legislador restringiu as hipóteses para a caracterização da milícia privada à prática dos crimes previstos no Código Penal. Desse modo, deve prevalecer a desclassificação para o delito de associação criminosa armada, pois a ampliação do alcance da norma disposta no art. 288-A do Código Penal, para incluir no âmbito de atuação do grupo criminoso os crimes previstos em legislação extravagante, não pode ser admitida, na medida em que a interpretação extensiva em prejuízo ao réu (in malam partem) é vedada no âmbito do direito penal.

Tese Firmada: Somente configura o crime de constituição de milícia privada se a atuação do grupo criminoso se restringe aos delitos previstos no Código Penal.

Questão Jurídica: Crime de milícia privada. Prática de crimes descritos na legislação extravagante. Interpretação extensiva in malam partem. Impossibilidade. Desclassificação para o delito de associação criminosa armada.

Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. IRRESIGNAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. DESCLASSIFICAÇÃO OPERADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM DO DELITO DE MILÍCIA PRIVADA PARA O CRIME DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA ARMADA. MANUTENÇÃO QUE SE IMPÕE. IMPOSSIBILIDADE DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA IN MALAM PARTEM NO ÂMBITO DO DIREITO PENAL. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Depreende-se da interpretação literal da norma disposta no art. 288-A do Código Penal - CP, que o legislador restringiu as hipóteses para a caracterização da milícia privada à prática dos crimes previstos no Diploma Repressivo. 2. Na hipótese, o Tribunal de origem consignou, expressamente, que o grupo criminoso "não se limitava somente aos crimes descritos no Código Penal, os quais podemos destacar: a posse e porte ilegais de armas de fogo de uso permitido e de uso restrito (Lei 10.826/03), agiotagem (art. 4°, "a", da Lei 1.521/51), comércio ilegal de combustíveis (art. 1°, I, da Lei 8.176/91), entre tantos outros", motivo pelo qual a conduta dos recorridos foi desclassificada do delito previsto no art. 288-A do CP (milícia privada) para o crime tipificado no art. 288, parágrafo único, do mesmo Diploma Legal (associação criminosa armada), mais favorável aos réus. 3. Correta a conclusão da Corte a quo, pois a ampliação do alcance da norma disposta no art. 288-A do CP, para incluir no âmbito de atuação do grupo criminoso os crimes previstos em legislação extravagante, não pode ser admitida, na medida em que a interpretação extensiva in malam partem é vedada no âmbito do direito penal. Desclassificação operada pelo Tribunal de origem mantida. 4. Recurso especial conhecido e desprovido. (REsp n. 1.986.629/RJ, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 8/8/2023, DJe de 15/8/2023.)